13 de dez. de 2012

Curiosity: muito barulho por nada. Ou não!



Finalmente, a agência espacial americana (Nasa) fez sua conferência de imprensa em San Francisco para anunciar a tão esperada descoberta que entraria para os livros de história, segundo o cientista principal da missão do robô Curiosity em Marte, John Grotzinger. Como eu já havia antecipado no post anterior, ninguém esperava que fosse anunciada a descoberta de vida, pois os instrumentos do jipe não permitem isso. Transmitida ao vivo pela internet, os principais pontos foram os seguintes:

O Curiosity escavou com seu braço robótico uma parte relativamente plana do fundo da Cratera Gale, onde está fazendo seus estudos. Esse material, na verdade, são pequenos montes de areia trazidos pelo vento. As amostras foram depositadas no jipe e analisadas por três dos seus dez instrumentos: o Analisador de Amostras de Marte (SAM), o instrumento de Mineralogia e Química (CheMin) e a câmera Mahli. As amostras foram chacoalhadas, para separar as pedras, e depois aquecidas. E aí começaram as análises.

O solo aquecido liberou vapor d’água, dióxido de carbono, oxigênio e dióxido de enxofre, nessa ordem de abundância. Tudo isso já era conhecido desde a década de 1970, em resultados similares obtidos pelas sondas vikings e, mais recentemente, pela sonda Phoenix Mars Lander. Inclusive as amostras de solo eram quase iguais, apesar de estarem a milhares de quilômetros de distância umas das outras.






A liberação de vapor d’água não significa que a amostra estava molhada, mas talvez apenas úmida, já que as moléculas de água se aderem muito facilmente aos grãos de areia. Entretanto, a quantidade liberada foi bem maior que a esperada.

Além desses gases, o módulo SAM identificou um composto de cloro, um perclorato, que também já havia sido detectado pela Phoenix em amostras de solo polar marciano. Naquela época, esse perclorato foi considerado o culpado de não se ter achado nenhum composto orgânico. Segundo as explicações da época, ele poderia ter destruído qualquer molécula orgânica.

Ma,s além disso, o SAM detectou compostos de metano clorado, ou seja, um composto orgânico. Esse deve ter sido o motivo de tanta empolgação de Grotzinger, ao afirmar que os dados que estavam chegando naquele momento da entrevista entrariam para a história.

Mas por que isso ainda não pode ser considerado histórico? Por um motivo simples: o cloro que compõe esse material é de origem marciana, certamente, mas será que o carbono também?

Já aconteceu antes, a detecção de metano em Marte – o que seria um grande passo na afirmação de que haveria vida no planeta vermelho – teve de ser revista. A amostra de atmosfera estava contaminada com ar da base de lançamento, na Flórida. O mesmo parece ter acontecido agora, segundo a equipe do Curiosity. Mas nem mesmo a equipe parece estar certa disso…

É que, analisando agora as razões isotópicas dos gases liberados das amostras, ou seja, a razão entre espécies químicas iguais, mas com massa molecular diferente, a conclusão que se chegou é de que o vapor d’água, o dióxido de carbono e a razão entre hidrogênio e deutério são maiores que as encontradas na Terra, um grande indicativo de que de não houve contaminação. Mas grandes descobertas exigem grandes confirmações, como diria o astrônomo Carl Sagan.

O fato é que, por falta de atmosfera, a superfície de Marte sofre com o bombardeio de raios cósmicos de alta energia, raios X e ultravioleta. Tudo isso pode modificar a composição química do solo, fazendo com que substâncias mais voláteis simplesmente se desprendam e evaporem em direção ao espaço. Então simplesmente não se pode descartar que a radiação solar esteja em ação nesse caso. Futuramente, uma missão que possa coletar amostras da atmosfera superior de Marte poderá analisar a presença dessas substâncias voláteis e confirmar essa hipótese. Enquanto isso, podemos dizer que detectamos algo, mas ainda não sabemos de onde vem.

Outro aspecto interessante da conferência da Nasa foi uma pergunta feita por um repórter da plateia. Ele quis saber como deixaram uma simples suspeita causar um buchicho tão forte no mundo inteiro.

Meio que no estilo “veja bem”, Grotzinger disse que era um cientista e que se empolga muito quando vê uma missão científica da qual ele participa dando resultados. O problema foi ter se empolgado justamente na frente de um repórter quando os resultados estavam chegando. Grotzinger falou também que não tinha culpa de que o mundo todo esteja tão conectado e ávido por novidades de Marte, a ponto de repercutir tanto qualquer notícia.

Bom, eu concordo em parte. Anunciar resultados bombásticos exige muito cuidado. E, para divulgar qualquer resultado vindo de Marte, todo cuidado é pouco!

No final das contas, foi um grande teste para os instrumentos do Curiosity. Mesmo que tenha detectado compostos terrestres, isso demonstra a grande sensibilidade desses equipamentos. A ideia do estudo era, na verdade, testar esses módulos, pois a amostra usada nem era da própria cratera, mas trazida pelo vento. Nesses aspectos, a Curiosity passou com louvor e podemos esperar boas surpresas no futuro. Mas agora, Grotzinger, segura a onda! Mais cuidado das próximas vezes!

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