FOLHA DE SÃO PAULO - terça - feira, 31/08/2010
IPCC precisa ser mais transparente sobre dúvidas que envolvem aquecimento, afirma grupo independente
Físico brasileiro está entre os 12 cientistas que participaram da elaboração de relatório apresentado ontem
SABINE RIGHETTI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
O IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática, na sigla em inglês) precisa passar por mudanças na sua gestão e na maneira como coleta informações se quiser se manter como a principal referência a respeito do aquecimento global.
Essa é a conclusão de um grupo independente de cientistas, que avaliou a atuação do painel a pedido da ONU, à qual o IPCC está ligado. O documento com o veredicto do grupo foi divulgado ontem.
"O problema é que o IPCC cresceu muito. Hoje são quase 2.000 cientistas envolvidos como autores e outros 2.000 revisores. É preciso criar um mecanismo de gestão da produção do relatório", diz Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da Fapesp e membro da Academia Brasileira de Ciências.
Ele é o único brasileiro entre os 12 cientistas escolhidos pelo IAC (InterAcademy Council), órgão que reúne academias de ciência mundo afora, para avaliar o IPCC.
NOVOS ARES
Uma das sugestões do documento é a criação de um comitê executivo que inclua membros de fora da comunidade do clima.
A definição de tempo de mandato no IPCC também é mencionada. O atual presidente, Rajendra Pachauri, está no cargo desde 2002. "É bom ter circulação de pessoas para ter novos pontos de vista", afirma Brito Cruz.
Do ponto de vista técnico, o relatório traz recomendações para o sistema de revisão das informações e no tratamento das incertezas das previsões climáticas.
"A revisão por pares é o mecanismo da comunidade científica para expor o trabalho à crítica. Num trabalho como o do IPCC, isso precisa ser feito com organização, senão críticas cruciais podem se perder", diz Brito Cruz.
Um exemplo mencionado pelo cientista, presente no relatório, é o caso das geleiras do Himalaia. O IPCC afirmou que tais geleiras desapareceriam em 2035, muito antes do que outras fontes sugerem.
As informações foram questionadas no processo de revisão por pares, mas a crítica foi ignorada.
"Esses erros sem dúvida fizeram com que o IPCC perdesse credibilidade", disse o coordenador do relatório, Harold Shapiro, no lançamento do documento.
NAS MARGENS
O relatório também ressalta a necessidade de utilização, pelo IPCC, da ciência publicada em revistas científicas que não estejam em língua inglesa, como as da China e da América Latina.
A "literatura cinza" -que não está publicada em revistas científicas (como teses ou material de ONGs)- também é abordada. "Deve haver normas para usar esse material", destaca Brito Cruz.
"Podemos mudar o IPCC para melhor, e vamos fazer isso", disse Rajendra Pachauri. Ele afirmou que não pretende renunciar ao cargo.
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