11 de jun. de 2010

Cientista ataca Big Bang e visão "estreita" dos físicos.

São Paulo, domingo, 30 de maio de 2010
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Para Mário Novello, muitos viraram apenas "técnicos muito competentes'.
Pesquisador critica a preocupação excessiva com carreira e prêmios;
para ele, dados poderão provar Universo eterno.
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DE SÃO PAULO

Para Mário Novello, físico do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas, no Rio de Janeiro, a cosmologia virou, com frequência, "uma coisa trivial, simplesmente saber qual porcentagem de matéria dessa categoria ou daquela tem no Universo".
Tão preocupante quanto isso, diz, é o esnobismo dos cientistas com a filosofia e a metafísica, que os impede de refletir sobre o que fazem. São apenas "técnicos extremamente competentes".
Novello está lançando o livro "Do Big Bang ao Universo Eterno" (Zahar), que resume sua defesa da ideia de que o Big Bang não foi o começo de tudo. Segundo ele, essa interpretação está conquistando cada vez mais físicos. Confira a entrevista abaixo.
(RICARDO MIOTO)

Folha - A ideia de um universo eterno está conquistando os físicos?

Mário Novello - Ninguém tem dúvidas de que o Universo esteve muito condensado no passado. O problema foi a identificação daquele momento, em que começa a expansão, como o começo de tudo. Sou contra definir o Big Bang como o marco zero. Isso é contra a atitude científica. Mas o cenário está mudando. Entre os cientistas há uma tendência a aceitar que chegou o momento de ir além do Big Bang como o começo.

Mas, quando jovem, o sr. não era partidário do Big Bang como o começo de tudo?

Eu não era. Era uma questão de princípio. A ciência é a tentativa de explicar racionalmente tudo que existe. Eu sabia muito bem que a ideia de singularidade [a concentração de toda a massa do Universo em um único ponto que teria dado origem a tudo que se conhece] significava abdicar de fazer ciência ao longo de toda a história do Universo, significava dizer que a ciência tinha limite. Eu não podia aceitar isso.
Na minha época, havia uma visão global do que era atividade humana. Havia cadeira de filosofia, de sociologia, tínhamos contato com o mundo. Existe uma falta de fundamentos, hoje, do que é fazer ciência. Você pode ser um técnico extremamente competente, mas fora da área técnica pode ser um ignorante completo, sem saber o que está por trás do que você está fazendo na sua área.
Mas aparentemente a maioria dos físicos ainda discorda do sr. sobre o Big Bang...
Se você entrevista cem físicos, 98 dizem que o Big Bang é verdade e dois malucos dizem que não. É razoável que a mídia fique em dúvida. Primeiro você precisa ver quem são essas pessoas. Eu criei a cosmologia no Brasil, tive mais de 50 alunos de doutorado, você precisa ver que não sou um bobo. Mudanças são lentas. E você sabe que os cientistas são extremamente reacionários.

Ser minoria não incomoda?

Quando você faz ciência, você precisa dialogar com a natureza, e não com os seus colegas. Se o seu objetivo é ganhar uma bolsa, ganhar fama, ganhar prêmio, isso não é ciência. Pode ser no mundo em que a gente vive. Estou pouco me importando com a opinião dos outros. Mas isso não significa isolacionismo, porque publico em revistas científicas.

Mas o senhor já tem uma carreira estabelecida. Um doutorando não deveria se preocupar com os pares?

Não deveria. Se ele começa a se preocupar lá, vai se preocupar a vida toda. Hoje em dia a cosmologia virou uma coisa trivial, ridícula, simplesmente saber qual porcentagem de matéria dessa categoria ou daquela tem no Universo. Isso não tem interesse nenhum. Quando começa a entrar nesse estágio, é o momento de mudar.

É possível fazer com que os cientistas se preocupem menos com os pares?

Ainda não conseguimos controlar a vaidade. É um sistema todo de premiação, bolsa disso, prêmio Nobel, tudo valoriza o indivíduo. E dá impressão de que, se você não valoriza o indivíduo, ele não vai fazer nada. E o prazer em fazer as coisas? O Garrincha dava de dez a zero em qualquer um desses caras aí de hoje em dia. E morreu com dez mil réis no bolso.
Você vai dizer que o exemplo que eu estou dando é de um maluco, uma pessoa totalmente pirada, uma mentalidade que nunca saiu dos 12 anos de idade. Tudo bem, é um exemplo extremo. Mas mostra que algo se perdeu.

Mas a vaidade sempre existiu, não?

Sim, claro, sempre existiu. Nem estou dizendo que o sistema, antigamente, era diferente. O que estou querendo dizer é que a razão pela qual Newton fazia aquilo não tinha nada ver com a razão pela qual um bolsista faz as coisas hoje em dia.

No caso do Big Bang, há expectativa de que alguma observação possa dar mais respostas sobre a sua legitimidade como marco zero?

Sim. Já foi lançado o satélite Planck. Ele, nos próximos anos, poderá ajudar a dizer, observacionalmente, se houve uma fase anterior ao colapso. Existe uma possibilidade de que o Universo esteja se acelerando. Ela surgiu de uns dez anos para cá. Isso não bate com as previsões do Big Bang como singularidade, como começo de tudo. Se o Universo estiver se acelerando, então aquilo que sustentou durante mais de 25 ou 30 anos o Big Bang acabou.

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