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Edição Online - 27/05/2010
Para a astronomia brasileira crescer e se tornar um ator global, é preciso que haja acesso dos astrônomos nacionais a essa infraestrutura.
Beatriz Barbuy*
© ESO
Desenho do E-ELT: maior telescópio do ESO ( e do mundo)
está previsto para estar pronto em 2018
A astronomia se distingue atualmente por atingir grandes avanços tecnológicos que permitem aos astrônomos uma obtenção de dados em um nível que antes era impossível atingir, tanto em comprimentos de onda antes inexplorados quanto em profundidade, chegando a objetos muito fracos na fronteira do Universo. O ingresso do Brasil no European Southern Observatory (ESO) nos inseriria em dois grandes projetos: o telescópio gigante E-ELT (European Extremely Large Telescope), com espelho de 42 metros, e o radiotelescópio Alma (Atacama Large Millimeter Array), assim como no mais completo e maior observatório da atualidade, que é o ESO, todos instalados ou em via de instalação, no Chile.
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Outra opinião
■ Para conhecer um ponto de vista diferente sobre a entrada do Brasil no ESO, acesso artigo de Augusto Damineli:
O ESO é uma organização intergovernamental, incluindo 14 países, e sua infraestrutura atual tem três observatórios no Chile: La Silla, com telescópios de 2,2 metros, 3,5 metros, 3,6 metros, além de uma dezena de outros pequenos; Paranal, com 4 telescópios de 8,2 metros (Very Large Telescope – VLT), com capacidade de operar interferometria óptica, o Vista (Visible and Infrared Survey Telescope for Astronomy) de 4,1 metros e outros com 1,8 metros a 2,5 metros; eChajnantor, com os radiotelescópios Apex (Atacama Pathfinder Experiment), e o grande projeto Alma, que estará completado em 2014. O telescópio gigante E-ELT será instalado a 20 quilômetros do VLT.
O ESO tem grande diversidade de telescópios e principalmente de instrumentos de alto desempenho e cobriria as necessidades da grande maioria dos astrônomos observadores brasileiros. A instrumentação disponível é a mais avançada da atualidade. De fato, o modo de desenvolvimento da instrumentação do ESO, que se faz em consórcios de diferentes laboratórios/universidades, e sob coordenação do ESO, vem produzindo instrumentos únicos. Note-se que um telescópio não é tudo, precisa-se de instrumentos; que tempo de telescópio não é tudo, pois se o instrumento é eficiente, pode atingir objetos mais fracos e em menos tempo, e/ou grande número de objetos simultaneamente, e/ou grande faixa espectral, o que pode ampliar o campo de observação e reduzir o tempo de observação necessário. Isso representa uma otimização muito significativa de tecnologia e pesquisa. Como exemplo, o ESO é o único observatório que está produzindo instrumentos de segunda geração dos telescópios de 8 metros, que se distinguem claramente daqueles de primeira geração. O primeiro deles, denominado X-shooter, tem cobertura espectral de 300 nanômetros até 2,5 mícrons (ou seja, do ultravioleta próximo ao infravermelho) e com grande eficiência.
Outro aspecto importante dessa organização é sua grande agilidade para resolver problemas técnicos, de maneira que não se perca tempo de observação. Ainda mais um fator importante, é dispor de pacotes de software de redução automática dos dados que saem dos telescópios, o que permite que o astrônomo possa fazer ciência com uso dos dados rapidamente.
Por essas razões, uma maioria significativa dos astrônomos brasileiros (3/4) apoia a ideia de entrada do Brasil como sócio do ESO.
A principal razão para entrarmos como sócios do ESO é que, atualmente, a infraestrutura disponível para a astronomia brasileira é insuficiente para a diversidade de campos de pesquisa que estão se desenvolvendo entre nós, o que faz com que uma grande parcela da comunidade venha tendo dificuldades em obter observações adequadas para seus trabalhos. Os telescópios Soar (Southern Observatory for Astrophysical Research, também no Chile) e Gemini (com dois telescópios, um no Chile e outro no Havaí) têm utilidade para uma fração da comunidade, mas não são suficientes para uma grande parte dela. Além do mais, a ideia é de que sejam mantidos o Soar e a participação no Gemini. O telescópio Soar já foi pago, e as operações estão garantidas por 20 anos desde sua inauguração em 2004. Conterá três instrumentos brasileiros, portanto servirá a uma comunidade particularmente interessada no seu uso. E quanto ao consórcio Gemini, o telescópio do Havaí, por exemplo, dá acesso ao hemisfério Norte.
Nossa entrada no ESO traria consigo intensa formação de recursos humanos e envolvimento da indústria brasileira. O ESO tem programas de inclusão e estímulo, para que os países associados garantam sua fração de tempo de observação e obtenham sua cota financeira para construção de instrumentos, pois de outra forma seria inaceitável pelos países que integram o consórcio. Como estratégia de adaptação para poder competir com projetos de alta qualidade, entraríamos, inicialmente, com uma fração baixa de tempo, e assim ficaríamos por 10 anos, durante os quais a comunidade passaria por um fundamental processo de adaptação, para um crescimento da qualidade da nossa ciência, antes de passarmos a membro pleno.
O custo, de fato, é alto, com a caução de entrada no valor de € 132 milhões. A anuidade, ao passar a membro pleno, seria de € 13,6 milhões. Embora pareça muito, essas verbas voltam ao país através de contratos para construção de instrumentos, bolsas para jovens e todas as viagens ao Chile/Europa dentro das atividades do ESO, isto, é claro, sem falar da coleta de dados pelos astrônomos, do valor científico, que é o principal. Se ingressarmos, deveremos estabelecer formação de pessoal para uso do radiotelescópio Alma, com doutoramentos sanduíche no ESO, conseguindo assim recuperar atividades de impacto nessa área. A verba da caução seria usada para a construção civil do sítio do telescópio gigante E-ELT por construtora brasileira e confecção de partes deste telescópio pela indústria aeroespacial brasileira (já há itens identificados).
Gostaria aqui de comentar que há um custo não palpável na opção de não entrarmos nesse observatório, que é o solapamento de uma competência nacional criada com a formação de pessoal competente capacitado, ao longo dos últimos 40 anos (os primeiros doutores se formaram no exterior no final dos anos 60). É uma comunidade sólida, com um bom número de astrônomos de destaque internacional, e que vem crescendo. Levantamento feito mostra que há 600 astrônomos no Brasil, incluindo pós-graduandos. As especialidades cobrem um bom número de áreas, desde sistema solar, planetas extrassolares até cosmologia observacional. Em 2009, foram produzidos 286 artigos na área de ciências espaciais, segundo lista do Institute for Scientific Information (ISI), em que há autoria/coautoria de astrônomos brasileiros.
Há uma grande demanda reprimida, e grupos em um grande número de áreas estão sendo frustrados e impossibilitados de formar novas gerações por falta de condições técnicas compatíveis com o nível científico já atingido. Portanto, se quisermos que a astronomia brasileira cresça, tornando o Brasil ator global na área, é preciso que haja acesso dos astrônomos brasileiros a essa infraestrutura.
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*Beatriz Barbuy é professora titular do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP).
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