11 de jun. de 2010

Mais perto das estrelas

Adesão brasileira a projetos de telescópios multinacionais divide opiniões - mas é fundamental para a ciência nacional.
André Julião
05/06/2010

Os brasileiros poderão olhar para o céu com uma visão mais acurada em poucos anos. O País se prepara para ingressar em dois audaciosos projetos em parceria com a Europa. Ambos estão inclusos no Plano Nacional de Astronomia (PNA), cuja versão preliminar foi discutida na 4ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, entre os dias 26 e 28 de maio, em Brasília. O projeto que está em fase mais avançada é o PAU (sigla em inglês para Física do Universo Acelerado), um empreendimento científico em associação com a Espanha.
O consórcio vai construir um telescópio de 2,5 metros de diâmetro no país europeu com custo estimado entre 14 e 18 milhões de euros. A parte que cabe ao Brasil, no entanto, deve sair por três milhões de euros. É o suficiente para construir a câmera de altíssima resolução que fará parte do observatório. O objetivo principal do projeto é observar a energia escura, que comporia 75% do universo atual. A natureza dessa parte do cosmos ainda é um mistério para os astrônomos.
Além da energia escura, conseguiremos observar asteroides e acompanhar a evolução da galáxia e das estrelas, afirma Renato Dupke, astrofísico do Observatório Nacional e coordenador da parte brasileira do projeto. As observações devem começar em 2012 e vão durar quatro anos, com resultados preliminares previstos para 2014. Os países participantes terão direito à exclusividade dos dados coletados durante um ano. Depois, ambos poderão usar o telescópio em estudos de interesse mútuo. Já existem planos de se criar um projeto semelhante, mas com tecnologias mais avançadas, diz Dupke.
Outra iniciativa visa à adesão do Brasil ao ESO (sigla em inglês para Observatório Europeu do Sul), organização de 14 países que opera vários telescópios na Cordilheira dos Andes, no Chile. O ministro de Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende, já enviou uma carta ao diretor-geral do observatório, Tim Dzeeuw, expressando a disposição do País. Dessa forma, teríamos acesso ao E-ELT (em português Telescópio Europeu Extremamente Grande), cuja operação deve ter início em 2018. As vantagens da adesão, no entanto, não são unanimidade. Seria uma irresponsabilidade, diz João Steiner, professor do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP e coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Astrofísica. Segundo ele, os astrônomos brasileiros vão competir em desigualdade com os europeus. Eles determinarão o tempo que cada pesquisador terá para seus estudos, diz.
Segundo Steiner, a participação de cada país varia de acordo com seu PIB (Produto Interno Bruto) e o investimento seria de R$ 1,24 bilhão em 20 anos. O Brasil só adere ao ESO se as condições forem aceitáveis uma exceção terá de ser aberta, afirma Albert Bruch, diretor do Laboratório Nacional de Astrofísica. Outros astrônomos defendem a entrada no programa europeu. Se quisermos que a astronomia brasileira cresça, tornando o Brasil ator global na área, é preciso que haja acesso dos astrônomos brasileiros a essa infraestrutura, disse Beatriz Barbuy, professora do IAG, em artigo na Revista da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo).
O Brasil já participa de pesquisas multinacionais com dois outros telescópios, Soar e Gemini, ambos no Chile. Eles dão conta da nossa demanda. Ainda estamos nos qualificando para aumentá-la, defende Steiner. Segundo ele, a comunidade de astrônomos brasileiros é relativamente pequena. São 235 profissionais que recebem salário de instituições, mais 60 alunos de pós-doutorado e 220 de mestrado e doutorado. Fica a questão: as próximas gerações encontrarão uma infraestrutura melhor para explorar o cosmos?

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