MARCELO GLEISER
Folha de São Paulo - 20/06/2010
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Alguma coisa tem de ser mudada na maneira como se usa energia.
E não só nos EUA, mas no mundo.
E não só nos EUA, mas no mundo.
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NA SEMANA PASSADA, um sombrio presidente Obama falou ao povo americano da Casa Branca. "É inaceitável não fazermos nada", afirmou. Seu discurso tinha o tom de um grito de guerra, se não na intensidade da sua voz (ele nunca perde a linha), ao menos na mensagem. Na quarta, a empresa petroleira BP criou um fundo de US$ 20 bilhões para ressarcir a população costeira que sofre com os milhões de galões de petróleo que cobrem suas praias e destroem seu ganha-pão.
Imagine algo semelhante ocorrendo no Brasil: a costa de Campos até Angra coberta por uma enorme mancha negra; ninguém vai à praia, os pescadores não pescam. As garantias oferecidas pela BP contra esse tipo de desastre, "estamos preparados para algo muito pior", não funcionaram. Parece ser bem mais fácil escavar um poço submarino a 1.500 m de profundidade do que saber como extirpar o seu vazamento.
É tudo uma questão de prioridade corporativa. A exploração do petróleo se dá em lugares cada vez mais remotos. Veja os 50 bilhões de barris na costa do Rio enterrados sob um densa camada de sal e a 2.200 m de profundidade. Será que seremos capazes de deter um vazamento?
Obama lembrou aos americanos que seu país consome em torno de 20% do petróleo mundial, enquanto suas reservas são de apenas 2%. Não é necessário ser um estrategista para ver que isso é um problema sério: se uma nação precisa de um recurso para sobreviver, vai fazer de tudo para obtê-lo.
Daí as guerras com tanques e bancos, as quase mil bases militares no estrangeiro, os tentáculos espalhados pelo mundo tentando controlar uma situação muito instável. Somando-se a isso o fato de que as maiores reservas de petróleo estão em países hostis aos EUA (e, claro, essa antipatia é consequência, ao menos em parte, da política externa invasiva dos americanos), a situação torna-se explosiva.
Alguma coisa tem de mudar.
Precisamos embarcar numa nova Revolução Industrial. A era dos combustíveis fosseis está acabando.
As companhias petroleiras têm uma excelente oportunidade para mudar sua imagem e tomar a dianteira, sendo os grandes instigadores da mudança. Existe muito dinheiro para ser feito numa economia verde.
À medida que a população mundial cresce, e um número cada vez maior de pessoas entra para a classe média, o apetite por energia só vai aumentar. Com isso, aumentará também o lucro das empresas que produzem e fornecem essa energia.
Uma super-rede, capaz de integrar fontes diferentes (sol, ventos, biomassa) e de transportar essa energia por enormes distâncias, o treinamento de mão de obra especializada, a formação de mais engenheiros e cientistas, a implantação de incentivos fiscais que motivem as pessoas e empresas a adotar tecnologias alternativas -essas são condições necessárias para que a nova revolução tome rumo. Necessárias, mas não suficientes.
As pessoas precisam se convencer disso. Olho para meu filho de quatro anos com um misto de otimismo e desespero. Sonho com um novo mundo, no qual interagimos com a natureza para preservá-la.
Essa guerra é entre nosso passado e nosso futuro. E o fato é que só pode ser lutada no presente.
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MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro "Criação Imperfeita"
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