28 de jun. de 2010

O maior reservatório mundial de água subterrânea

Geofísica Brasil


Pesquisadores da Universidade Federal do Pará (UFPA) afirmam que o Aqüífero Alter do Chão, na região Norte do país, é o maior manancial do planeta.
De acordo com os especialistas paraenses, a reserva seria mais significativa que o próprio Aquífero Guarani, até então, considerado o mais importante recurso hídrico descoberto no Brasil e na América do Sul.

O professor Milton Matta, da Universidade Federal do Pará, faz parte da equipe que coordena os estudos do Aquífero Alter do Chão. Segundo o geólogo, os dados sobre o aquífero do norte são muito raros na literatura. A pesquisa mais sistemática começou no ano passado, liderada pelos professores Francisco Matos de Abreu, André Montenegro Duarte e Mário Ramos Ribeiro, todos da UFPA; além do professor Itabaraci Cavalcante, da Universidade Federal do Ceará (UFC).

Segundo Matta, a extensão superficial do Aquífero Guarani (1,1 milhão de quilômetros quadrados) é maior que a do Alter do Chão (ainda sem dados precisos), mas as espessuras do segundo são mais representativas, o que resultaria em maior volume de água. "Dados preliminares apontaram para um volume de água superior a 86.000 quilômetros cúbicos", afirma. De acordo com dados do Ministério do Meio Ambiente, a reserva do Guarani está calculada em 30 mil quilômetros cúbicos.

"Essa descoberta representa um potencial estratégico de água para o Brasil e para a humanidade. Tem-se a certeza de que com a água deste aquífero pode-se abastecer a população mundial por algumas centenas de anos, além de proporcionar água suficiente para indústria e para a agricultura", sustenta.

Capacidade

De acordo com os pesquisadores, os parâmetros hidrodinâmicos do aquífero Alter do Chão (que medem a capacidade de armazenar água e dessa água ser retirada por bombeamento) também indicam um grande potencial de armazenamento hídrico. A argumentação é de que os tipos litológicos (rochas) podem ter melhores condições de armazenamento, circulação de água e captações muito mais baratas em relação ao Aquífero Guarani.

"Certamente, vai proporcionar obras de captação menos onerosas que o Guarani, que, além de mais profundo, possui uma espessa camada de rochas basálticas sobre ele. Isso dificulta e encarece a perfuração de poços. Precisamos ainda, nos nossos estudos, determinar com precisão razoável as profundidades e espessuras do Alter do Chão e analisar como esses elementos variam lateralmente", explica Milton Matta.

Segundo o doutor em hidrogeologia, que também trabalha com geologia estrutural, os pesquisadores paraenses avaliam essa superioridade do Alter do Chão em relação ao Guarani e às demais reservas do mundo, mas ainda se ressentem da falta de dados concretos para convencer a comunidade técnico-científica. A qualidade da água da reserva também deve também ser um novo foco nos estudos.

O Alter do Chão é responsável pelo abastecimento de várias cidades na Amazônia. Suas águas subterrâneas atendem quase todos os municípios do Oeste do Pará e do estado do Amazonas, inclusive a cidade de Santarém, "com águas de excelente qualidade", assegura Matta.

Financiamento

A hipótese é baseada em estudos ainda iniciais, mas os fortes indícios foram o suficiente para entusiasmar os cientistas. Depois dos estudos preliminares, os técnicos planejam preparar um projeto para apresentar ao Banco Mundial e a outros financiadores. A intenção é viabilizar um levantamento mais detalhado sobre o potencial do aquífero. Dados para comprovar definitivamente que se trata do maior reservatório subterrâneo de água doce do mundo.

Pelo cálculo dos pesquisadores, um estudo mais aprofundado exigirá investimentos na ordem de US$ 5 milhões. A primeira etapa do projeto seria destinada à sistematização de todo o material disponível, tabulações, análise de confiabilidade e interpretações desses dados; com prazo previsto de oito meses e custos em torno de R$ 300 mil a R$ 400 mil reais.

A segunda etapa, mais longa, com duração estimada de quatro anos, envolveria um conjunto de ações metodológicas, com trabalhos de campo, obtenção de dados primários e levantamentos de sensoriamento remoto, geofísicos, geológicos e hidrogeológicos.

A principal preocupação dos pesquisadores é a dificuldade de se conseguir recursos para avançar com a pesquisa e estabelecer os critérios para utilização sustentável desse manancial. "Sabemos que existem, na área sobre o Alter do Chão, muitos processos contaminantes que podem alcançar as águas do aquífero se nada for feito pelos poderes constituídos", alerta Matta.

"As articulações políticas já começaram a ser feitas, mas o que se precisa no momento é de divulgação desse projeto junto à sociedade, à classe técnico-científica e ao ambiente político, no sentido de se demonstrar a importância do Aquífero Alter do Chão para o país e para o futuro da humanidade", declara.

Astrônomos detectam super tempestade em exoplaneta

Redação do Site Inovação Tecnológica - 24/06/2010

As observações de elevada precisão de monóxido de carbono mostram que este gás se desloca em alta velocidade numa corrente que vai do lado diurno, muito quente, do planeta para o lado noturno, mais frio.[Imagem: Snellen et al./Nature]


Os astrônomos detectaram pela primeira vez uma super tempestade na atmosfera de um exoplaneta, um já bem estudado "Júpiter quente", mais conhecido pelos cientistas como HD209458b.

As observações de elevada precisão de monóxido de carbono mostram que este gás se desloca em alta velocidade numa corrente que vai do lado diurno, muito quente, do planeta para o lado noturno, mais frio.

As observações forneceram outro detalhe completamente inédito - a medição da velocidade orbital do próprio exoplaneta, permitindo assim uma determinação direta da sua massa.

"O HD209458b não é exatamente um local bom para quem sofre do coração. Ao estudar o gás venenoso de monóxido de carbono com grande precisão, descobrimos evidências de um super vento, que sopra a uma velocidade entre os 5.000 e os 10.000 km por hora," diz Ignas Snellen, que coordenou a equipe de astrônomos que fez a pesquisa.

Planeta sem rotação

O exoplaneta HD209458b tem cerca de 60% da massa de Júpiter, orbitando uma estrela parecida com o Sol, situada a cerca de 150 anos-luz de distância, na direção da constelação de Pégaso.

A uma distância da sua estrela de apenas uma vigésima parte da distância Sol-Terra, o planeta é intensamente aquecido pela sua estrela, apresentando na superfície uma temperatura de cerca de 1.000º Celsius no lado mais quente.

Como o planeta não tem rotação, tendo sempre o mesmo lado voltado para a estrela, esse lado é muito quente, enquanto o outro é muito mais frio. "Na Terra, grandes diferenças de temperatura levam inevitavelmente a ventos extremos e, como revelam nossas medições, a situação em HD209458b não é diferente," diz Simon Albrecht, outro membro da equipe.

Trânsito planetário


Impressão artística de um exoplaneta gigante gasoso, semelhante a Júpiter, passando em frente à sua estrela. [Imagem: ESO/L. Calçada]

O HD209458b foi o primeiro exoplaneta a ser encontrado por meio de uma técnica conhecida como "trânsito": a cada 3,5 dias o planeta passa à frente da sua estrela, bloqueando uma pequena parte da radiação estelar durante um período de três horas.

Durante este evento, uma pequeníssima fração da radiação estelar é filtrada pela atmosfera do planeta deixando uma pequena marca.

Uma equipe de astrônomos da Universidade de Leiden, do Instituto Holandês para a Investigação Espacial (SRON) e do MIT, nos Estados Unidos, utilizou o Very Large Telescope, do Observatório Europeu do Sul (ESO) e o seu potente espectrógrafo CRICES para detectar e analisar estas impressões digitais muito tênues, observando o planeta durante cerca de cinco horas, à medida que este passava em frente à estrela.

"O CRICES é o único instrumento do mundo capaz de obter espectros tão precisos quanto o necessário para determinarmos a posição das riscas de monóxido de carbono com uma precisão de 1 para 100.000," diz Remco de Kok, outro membro da equipe. "Esta elevada precisão permitiu-nos medir pela primeira vez a velocidade do gás de monóxido de carbono utilizando o efeito Doppler."

Vida em outros pontos do Universo

Os astrônomos obtiveram ainda vários outros resultados inéditos. Por exemplo, eles mediram diretamente a velocidade do exoplaneta à medida que este orbita a sua estrela.

"Geralmente, a massa de um exoplaneta é determinada através de medições do movimento da estrela e assumindo o valor da massa da estrela, de acordo com a teoria. Mas, neste caso concreto, conseguimos medir o movimento do planeta e assim determinar a massa tanto da estrela como do planeta," diz o coautor Ernst de Mooij.

Os astrônomos mediram também, e pela primeira vez, a quantidade de carbono presente na atmosfera de um exoplaneta. "Parece que o H209458b é, na realidade, rico em carbono, como Júpiter e Saturno. Este fato poderá indicar que se formaram da mesma maneira," diz Snellen."

No futuro, os astrônomos poderão utilizar este tipo de observação para estudar as atmosferas de planetas do tipo terrestre, tentando assim determinar se existe vida em outros lugares do Universo.

Bibliografia:
The orbital motion, absolute mass and high-altitude winds of exoplanet HD 209458b
Ignas A. G. Snellen, Remco J. de Kok, Ernst J. W. de Mooij, Simon Albrecht
24 June 2010
Vol.: 465, 1049-1051
DOI: 10.1038/nature09111

Bola da Copa é testada pela NASA e pelo IPT

Agência Fapesp - 24/06/2010



Pesquisadores do IPT, em São Paulo, realizaram testes no túnel de vento atmosférico do instituto com bolas de torneios oficiais de futebol.[Imagem: IPT]
Bola da vez

Golaço ou gol contra? A maior polêmica da Copa do Mundo na África do Sul até o momento ainda não tem uma conclusão. Para alguns, a bola oficial do evento, denominada Jabulani ("celebração", em zulu), representa uma notável evolução do ponto de vista tecnológico. Para outros, o resultado deixou a desejar.

O atacante Luis Fabiano, da Seleção Brasileira, criticou. O goleiro Júlio César chamou de "bola de supermercado". Fernando Torres, atacante espanhol, também falou mal. Kaká está entre os que elogiaram.

As maiores críticas foram com relação aos movimentos imprevisíveis, promovidos pela resposta aerodinâmica da nova redonda, especialmente nos chutes mais fortes. Na primeira rodada, com o baixo número de gols, a reclamação foi ainda maior. Mas no fim da primeira fase da Copa, os gols voltaram. Portugal enfiou sete na Coreia do Norte. O próprio Luis Fabiano marcou dois contra a Costa do Marfim.

Aerodinâmica da bola da copa

Para o fabricante, a Adidas, a bola representa um avanço. Mas o próprio presidente da empresa, Herbert Hainer, reconheceu que é preciso um certo tempo para acostumar com a Jabulani, por ser "mais aerodinâmica e mais rápida".

Recentemente, físicos australianos testaram a aerodinâmica da bola copa.

Agora foi a vez de uma equipe formada por pesquisadores da Nasa, a agência espacial norte-americana, e do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), de São Paulo, decidirem avaliar o comportamento da Jabulani.

No Centro de Pesquisa Ames da Nasa, na Califórnia, forma feitos testes para comparar a bola com a usada na bola da Copa de 2006 na Alemanha, a Teamgeist ("espírito de equipe").

A Teamgeist, no lugar dos hexágonos costurados das bolas tradicionais, tinha oito painéis fundidos por um processo térmico, que elimina a necessidade de costura, mesmo interna, entre eles. A Jabulani tem 14 painéis e ganhou sulcos aerodinâmicos.

Superfície e altitude

A conclusão da Nasa é que, com a Jabulani, os jogadores não deverão ter melhor controle do que com a Teamgeist.

"É bem óbvio. O que estamos vendo é um efeito knuckle-ball", disse Rabi Mehta, engenheiro aeroespacial no centro Ames.

Knuckle-ball é um arremesso no beisebol no qual a bola não é segura com os dedos, mas sim com seus nós, resultando em movimento com acentuada curva e imprevisível para o rebatedor.

Segundo Mehta, quando a Jabulani se desloca em velocidade elevada, o ar próximo à superfície é afetado pela superfície, resultando em um fluxo assimétrico. Essa assimetria cria forças laterais que podem resultar em mudanças súbitas no percurso. De acordo com o cientista, a Jabulani tende a assumir o efeito knuckle ao superar os 75 km/h, o que corresponde a um chute forte.

Outro ponto a se considerar, segundo Mehta, é que vários dos estádios em que ocorrem os jogos na Copa da África do Sul estão em altitude elevada (Joanesburgo, por exemplo, fica a cerca de 1.600 metros do nível do mar). "Isso afeta a aerodinâmica da bola, uma vez a densidade do ar é menor. Em altitudes altas, a bola tende a se deslocar mais rapidamente, com menos empuxo", disse.

Jabulani no túnel de vento

Os pesquisadores Gilder Nader e Antonio Luiz Pacífico, do Laboratório de Vazão do IPT, por sua vez, realizaram testes no túnel de vento atmosférico do instituto com bolas de torneios oficiais de futebol.

Foram testadas as bolas do campeonato Paulista e Brasileiro deste ano e das copas de 2006 e 2010. Os testes foram encomendados pela Rede Globo. Segundo Nader, foram feitas medições com visualização do escoamento de ar em volta de cada bola. Para isto foi utilizado o sistema PIV (Particle Image Velocimetry) com emprego de raios laser.

"Verificamos que a bola do Campeonato Brasileiro, por exemplo, com superfície mais rugosa, do tipo clássico, tem coeficiente de arrasto (resistência ao ar) mais baixo e bom deslocamento. As bolas das Copas apresentaram um 'descolamento' mais rápido e maior coeficiente de arrasto", disse.

Ponto de crise

Ao ser chutada, uma bola ganha uma velocidade inicial que vai diminuindo até que, em um determinado momento, atinge o chamado "ponto de crise de arrasto", explicou Gilder.

"É quando ela faz uma curva. Com a bola do 'Brasileirão', esse ponto demorou mais para ser alcançado, em uma velocidade de aproximadamente 13 metros por segundo. A Jabulani atinge esse ponto e faz a curva bem antes, em uma velocidade que ainda vamos medir com exatidão", disse.

As bolas de futebol evoluem constantemente, com as grandes novidades surgindo justamente em cada Copa do Mundo. As atuais, e não apenas a Jabulani, são muito diferentes das usadas há meio século. Na Copa da Suécia, em 1958, por exemplo, a bola era de couro curtido, chamada de "capotão", pesada e que se encharcava em dias chuvosos, dificultando a precisão dos chutes.

Mas isso, claro, não impediu que o Brasil fosse campeão nem que um certo garoto apelidado de Pelé, então com 17 anos, assombrasse o mundo com momentos antológicos, como o gol na final, em que deu um lençol no zagueiro sueco e chutou a bola ainda no ar para o fundo das redes e da história. Mostrou que craque que é craque dá show com qualquer bola. E isso o mundo já está vendo na Copa da África do Sul, independentemente das polêmicas da bola.

Cientistas tentam recriar som da "Partícula de Deus"

BBC - 23/06/2010



O processo de transformar dados científicos em sons é chamado sonificação. Até o momento, a equipe de Asquith havia criado diversas simulações baseadas em previsões do que aconteceria durante as colisões no LHC.[Imagem: CERN]


Sons de Deus?

Cientistas simularam o som de partículas subatômicas produzidas no Grande Colisor de Hádrons (LHC), na Suíça.

O objetivo é facilitar a identificação da chamada "partícula de Deus" - o bóson de Higgs - cuja existência ainda não foi confirmada, mas que, segundo teorias, daria massa a todas as outras.

A cientista Lily Asquith coordenou a equipe que desenvolveu o modelo que transforma dados do gigantescoexperimento Atlas, no LHC, em sons.

O experimento mostra que "ouvir os dados" tem uma função prática, muito além de um significado poético. Carl Sagan explorou o tema em seu livro Contato, em que a cientista prefere "ouvir" as transmissões vindas do espaço do que confiar nas análises precisas feitas pelos computadores.

"Se a energia estiver perto de você, você ouve um som grave, e se estiver mais longe, mais agudo", disse Asquith.

Colisões de prótons

O colisor é um projeto bilionário construído na fronteira entre a França e a Suíça para tentar responder algumas perguntas fundamentais para a física.

O experimento acontece em um túnel circular de 27 quilômetros de comprimento, repleto de imãs que "conduzem" prótons pelo imenso anel.

Em certos pontos do trajeto, os feixes de prótons mudam de trajetória e se chocam em quatro experimentos, que são minuciosamente monitorados pelos cientistas.

É nessas colisões que os estudiosos esperam encontrar novas partículas subatômicas, como o bóson de Higgs, que ajudariam a entender a origem do Universo.

Sonificação

Atlas é um dos quatro experimentos do colisor. Um instrumento batizado de calorímetro é usado para medir energia e é composto de sete camadas concêntricas.

Cada uma dessas camadas é representada por um tom diferente, dependendo da quantidade de energia contida nele.

O processo de transformar dados científicos em sons é chamado sonificação. Até o momento, a equipe de Asquith havia criado diversas simulações baseadas em previsões do que aconteceria durante as colisões no LHC.

Só agora eles começaram a utilizar dados de experimentos reais.

Sons de dados

"Quando você ouve as sonificações, na realidade, o que você está ouvindo são dados. Elas são fiéis aos dados e dão informações sobre os dados que não seriam possíveis de se obter de qualquer outra maneira", disse Archer Endrich, um desenvolvedor de software que trabalha no projeto.

Pela sonificação, os cientistas esperam poder identificar diferenças sutis para detectar novas partículas.

Um compositor envolvido com o projeto, Richard Dobson, destacou ter ficado impressionado com a musicalidade das colisões.

"É possível ouvir estruturas claras nos sons, quase como se tivessem sido compostas. Cada uma parece contar uma pequena história. São tão dinâmicas e mudam o tempo todo, que se parecem muito com as composições contemporâneas", disse o músico.

Uma nova Revolução Industrial

MARCELO GLEISER

Folha de São Paulo - 20/06/2010
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Alguma coisa tem de ser mudada na maneira como se usa energia.
E não só nos EUA, mas no mundo.
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NA SEMANA PASSADA, um sombrio presidente Obama falou ao povo americano da Casa Branca. "É inaceitável não fazermos nada", afirmou. Seu discurso tinha o tom de um grito de guerra, se não na intensidade da sua voz (ele nunca perde a linha), ao menos na mensagem. Na quarta, a empresa petroleira BP criou um fundo de US$ 20 bilhões para ressarcir a população costeira que sofre com os milhões de galões de petróleo que cobrem suas praias e destroem seu ganha-pão.
Imagine algo semelhante ocorrendo no Brasil: a costa de Campos até Angra coberta por uma enorme mancha negra; ninguém vai à praia, os pescadores não pescam. As garantias oferecidas pela BP contra esse tipo de desastre, "estamos preparados para algo muito pior", não funcionaram. Parece ser bem mais fácil escavar um poço submarino a 1.500 m de profundidade do que saber como extirpar o seu vazamento.
É tudo uma questão de prioridade corporativa. A exploração do petróleo se dá em lugares cada vez mais remotos. Veja os 50 bilhões de barris na costa do Rio enterrados sob um densa camada de sal e a 2.200 m de profundidade. Será que seremos capazes de deter um vazamento?
Obama lembrou aos americanos que seu país consome em torno de 20% do petróleo mundial, enquanto suas reservas são de apenas 2%. Não é necessário ser um estrategista para ver que isso é um problema sério: se uma nação precisa de um recurso para sobreviver, vai fazer de tudo para obtê-lo.
Daí as guerras com tanques e bancos, as quase mil bases militares no estrangeiro, os tentáculos espalhados pelo mundo tentando controlar uma situação muito instável. Somando-se a isso o fato de que as maiores reservas de petróleo estão em países hostis aos EUA (e, claro, essa antipatia é consequência, ao menos em parte, da política externa invasiva dos americanos), a situação torna-se explosiva.
Alguma coisa tem de mudar.
Precisamos embarcar numa nova Revolução Industrial. A era dos combustíveis fosseis está acabando.
As companhias petroleiras têm uma excelente oportunidade para mudar sua imagem e tomar a dianteira, sendo os grandes instigadores da mudança. Existe muito dinheiro para ser feito numa economia verde.
À medida que a população mundial cresce, e um número cada vez maior de pessoas entra para a classe média, o apetite por energia só vai aumentar. Com isso, aumentará também o lucro das empresas que produzem e fornecem essa energia.
Uma super-rede, capaz de integrar fontes diferentes (sol, ventos, biomassa) e de transportar essa energia por enormes distâncias, o treinamento de mão de obra especializada, a formação de mais engenheiros e cientistas, a implantação de incentivos fiscais que motivem as pessoas e empresas a adotar tecnologias alternativas -essas são condições necessárias para que a nova revolução tome rumo. Necessárias, mas não suficientes.
As pessoas precisam se convencer disso. Olho para meu filho de quatro anos com um misto de otimismo e desespero. Sonho com um novo mundo, no qual interagimos com a natureza para preservá-la.
Essa guerra é entre nosso passado e nosso futuro. E o fato é que só pode ser lutada no presente.

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MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro "Criação Imperfeita"

18 de jun. de 2010

Grandes esperanças para a ciência brasileira

NATURE/ VOL 465/ 10 JUN 2010

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Enquanto o presidente Lula prepara para deixar o governo, pesquisadores esperam que a inovação revigore a economia
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Por Anna Petherick




É raro que um chefe de Estado termine o segundo mandato com índices de aprovação de cerca de 80%. Mas quando o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, subiu ao palco no mês passado em uma conferência de ciência-política, sua popularidade era clara: mais de 3 mil cientistas, administradores e empresários se levantou para aplaudi-lo e para animar o seu ministro da ciência de cinco anos, Sergio Rezende.

Com um governo convencido de que a ciência é uma parte essencial de uma economia em crescimento, os pesquisadores brasileiros nunca conheceram tempos melhores, e a 4ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação em Brasília, de 26 a 28 de maio, foi repleta de otimismo para um futuro ainda mais luminoso. Na conferência, Lula assinou uma série de projetos que ajudarão a sustentar o seu legado de investimentos em ciência depois que ele e Rezende deixarem seus cargos, em 1º de Janeiro de 2011. Os projetos de lei, se aprovados pelo Congresso Nacional, irão aumentar o financiamento para pós-doutorados e estabelecer três novos centros de pesquisa da biodiversidade, com o objetivo de reduzir ainda mais a fuga de cérebros do país e talvez até mesmo revertê-la.

A conferência vai entregar uma declaração de consenso da cúpula científica do Brasil de onde o seu programa de pesquisa deve focar na próxima década. O documento é suscetível de ser influente, diz Luiz Davidovich, diretor da Academia Brasileira de Ciências, um físico da Universidade Federal do Rio de Janeiro. "A conferência é a primeira vez que os que estão no coração da ciência, e aqueles envolvidos de forma tangencial, foram todos trazidos juntos, e num momento em que as coisas estão realmente decolando", acrescenta Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da FAPESP, a fundação estatal de pesquisa de São Paulo. A declaração de consenso, que deverá ser publicada dentro de dois meses, será enviada a todos os candidatos presidenciais.

Uma sugestão importante que se espera estar na declaração é a promoção de centros de excelência. "Precisamos cuidar dos nossos Pelés, bem como construir mais campos de futebol", diz Brito Cruz. "O foco atual de financiamento é de novos centros, mas não há nenhum programa específico para financiar pesquisadores-estrelas." Outra proposta é oferecer mais incentivos para as empresas multinacionais realizarem pesquisa e desenvolvimento no Brasil.

Essas políticas se baseariam em uma fundação com recursos para investir. O Ministério da Ciência e Tecnologia diz que depois que Lula tomou posse, em 2003, o financiamento público e privado total em ciência e tecnologia subiu de R$ 21,4 bilhões para R$ 43,1 bilhões, em 2008 (ou de 1,26% para 1,43% do PIB) – em parte devido a Lula e às políticas implementadas pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Publicações por brasileiros em revistas científicas saltaram de 14.237, em 2003, para 30.415, em 2008, segundo dados analistas da Thomson Reuters.

Isso é impressionante, não só no contexto da América Latina, mas também em comparação com Rússia, Índia e China, por exemplo. Em 2000, o Brasil gerou 43% de publicações científicas da América Latina. A produção científica, desde então, melhorou em toda a região, mas, em 2008, as publicações brasileiras eram 55% do total. O Brasil tem pontos fortes em ciência agrícola; por exemplo, em 2000, um consórcio com sede em São Paulo se tornou o primeiro no mundo a seqüenciar o genoma de um patógeno de planta, a bactéria Xylella fastidiosa, que destrói as culturas de citros.

O Brasil gasta muito mais por investigador que a China ou a Rússia, de acordo com o seu Ministério da Ciência. "Acredito que chegamos a um ponto em que o setor vai crescer organicamente", diz Rezende. "Assim, a próxima pessoa responsável não terá que fazer muito."

A ciência também está indo bem no nível de cada Estado, estes que constituem uma fonte importante de financiamento público, embora os esforços para impulsionar a ciência sejam desiguais. Muitos estados estão procurando imitar o rico São Paulo, que tem a maior tradição científica. "Há um artigo de 1947, na Constituição do Estado de São Paulo", explica Brito Cruz."Ele diz que 1% de todas as receitas do Estado devem ir para pesquisa. Nenhuma outra agência de financiamento para a ciência, possivelmente no mundo inteiro, tem esse tipo de segurança financeira e autonomia (do governo federal)."

Os benefícios de ter um financiamento significativo separado de fontes federais foram sentidas mais intensamente na década de 1990, quando o governo do Brasil lutou com as tensões econômicas, como a hiperinflação. O financiamento para a ciência secou no resto do país, mas os pesquisadores em São Paulo experimentoaram perturbações muito menores. Recentemente, outros estados copiaram esta legislação. Além disso, três das grandes universidades estaduais de São Paulo recebem 9,57% do ICMS arrecadado pelo estado, dando-lhes um impulso único.

Mas, mesmo em São Paulo, o crescimento na pesquisa publicada não tem sido acompanhado pelo crescimento na pesquisa patenteada, que é fundamental para que a ciência revigore a economia e proporcione uma melhor qualidade de vida de 193 milhões de habitantes do Brasil. A maioria dos cientistas na conferência de maio concordaram que a solução deste problema é provavelmente o maior desafio para a ciência brasileira.

No início de seu mandato, governo Lula legalizou o financiamento de pesquisadores pelo governo via empresas privadas, e concedeu benefícios fiscais às empresas que investem em inovação. Mas o número de invenções patenteadas que sai do Brasil aumentou apenas ligeiramente desde que estas medidas foram aprovadas. "O problema é que os dirigentes da empresa têm a opção de colocar o dinheiro nas mãos de seus chefes de finanças para gerar um retorno nos mercados financeiros, ou nas de seu chefe de pesquisa e desenvolvimento, o que é arriscado e caro", diz Eduardo Viotti, da Universidade de Columbia, em Nova York, que aconselha o Senado brasileiro sobre a política de ciência. "No passado, pelo menos, pareceu menos arriscado para eles a apostar nos mercados financeiros".

A pesquisa e desenvolvimento privada está sendo impulsionada pela descoberta, em 2007, de grandes jazidas de petróleo ao largo da costa de São Paulo e Rio de Janeiro. Quando o petróleo começar a fluir, Lula prometeu que uma parte das riquezas será desviada para a ciência. O percentual exato ainda está sendo debatido, mas será definido antes de Lula e Rezende deixarem seus cargos.

As chances são boas de que os cientistas consigam boa parte do que pedirem em sua lista de consenso, mesmo depois da saída de Lula. Os líderes nas pesquisas para a eleição presidencial de outubro são José Serra, ex-governador da amiga da ciência São Paulo, e a ex-chefe da Casa Civil de Lula, Dilma Roussef, que deve continuar a sua política. Estes podem incluir o plano de elevar os gastos com ciência para 2% do PIB em 2020.

NASA cria sistema de previsão de tsunamis

 Site Inovação Tecnológica - 17/06/2010


Os dados gerados pela rede GPS Diferencial Global(GDGPS), para prever o tamanho da tsunami, foram confirmados por meio de medidas da altura da superfície do mar, feitas pelos satélites de altimetria Jason-1 e Jason-2. [Imagem: NASA/JPL-Caltech]

Uma equipe de cientistas da NASA demonstrou com sucesso pela primeira vez os elementos de um sistema de previsão de tsunamis.
O sistema experimental, em escala de protótipo, avalia com rapidez e precisão os grandes terremotos e estima o tamanho das tsunamis geradas por eles.

Dados de GPS

Após o terremoto de magnitude 8,8, que atingiu o Chile em 27 de fevereiro, uma equipe liderada por Tony Song, do Laboratório de Propulsão a Jato da NASA, usou os dados, em tempo real, gerados pela rede GPS Diferencial Global (GDGPS), para prever o tamanho da tsunami resultante.
Essa rede combina dados global e regionais em tempo real, gerados a partir de centenas de pontos geográficos monitorados por GPS, e calcula sua posição a cada segundo. O sistema consegue detectar movimentos de terra com precisão de alguns centímetros.
"Este teste bem-sucedido demonstra que os sistemas costeiros de GPS podem efetivamente ser utilizados para prever o tamanho de tsunamis," afirma Song. "Isso vai permitir que as agências responsáveis emitam avisos que podem salvar vidas e reduzam os falsos alarmes, que podem perturbar desnecessariamente a vida das populações costeiras."

Previsão de tsunami

O sistema previu que o terremoto do Chile, o quinto maior já registrado por instrumentos na história, geraria uma tsunami moderada, de alcance local, com pouca probabilidade de causar destruição significativa no Pacífico.
De fato, o efeito da tsunami foi relativamente pequena fora do Chile, embora tenha causado a maior parte das fatalidades naquele país.
A previsão baseada em GPS foi posteriormente confirmada por meio de medidas da altura da superfície do mar, feitas pelos satélites de altimetria Jason-1 e Jason-2.

Modelo de tsunami

Os sistemas de alerta de tsunamis atuais dependem de estimativas da localização do epicentro do terremoto, da sua profundidade e da sua magnitude, para determinar se pode surgir uma grande tsunami.
No entanto, a história tem mostrado que magnitude do terremoto não é um indicador confiável do tamanho da tsunami. Os modelos anteriores assumiam que a potência de uma tsunami é determinada por quanto o fundo do mar é deslocado verticalmente.
A teoria de Song propõe que os movimentos horizontais de uma falha continental também contribuem para alimentar a tsunami, transferindo energia cinética para o oceano.

Evento discute primeira missão astronômica espacial brasileira

Site Inovação Tecnológica
Com informações do MCT - 14/06/2010

Uma delegação italiana de especialistas em Astrofísica está no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em São José dos Campos (SP), para discutir os instrumentos científicos do Mirax (Monitor e Imageador de Raios X).
Primeira missão astronômica espacial brasileira a bordo de um satélite, o Mirax é destinado ao estudo do centro da galáxia e seus objetos, como buracos negros e estrelas de nêutrons.

Fontes de raios X

Além da câmara imageadora de raios X, desenvolvida no Brasil pelo Inpe, o Mirax poderá receber mais dois instrumentos, estes italianos.
O Mirax estará a bordo do Lattes, um satélite científico desenvolvido pelo Inpe e com lançamento previsto para 2014, que atenderá não só aos objetivos astronômicos como também a missão Equars, esta voltada para estudos na baixa, média e alta atmosfera e ionosfera na região equatorial.
No caso da missão Mirax, o objetivo é realizar um levantamento sem precedentes do comportamento espectral e temporal de um grande número de fontes transientes de raios X em escalas de tempo de horas a meses.
"Essas fontes de raios X apresentam comportamento variável no tempo e precisam de instrumentos que observem um grande número de fontes pelo máximo de tempo possível. Os emissores de raios X estão geralmente associados à presença de objetos compactos remanescentes de estrelas - buracos negros, estrelas de nêutrons e anãs brancas - e, em muitos casos, manifestam-se através de gigantescas explosões cósmicas", explica João Braga, vice-diretor do Inpe e coordenador do Mirax.

Conhecimento do universo

Os instrumentos do Mirax estão sendo desenvolvidos no Inpe, em cooperação com outras instituições do Brasil, como USP, UFRN e UFRS, e do exterior, como Universidade da Califórnia e MIT - Instituto de Tecnologia de Massachusetts, dos Estados Unidos, e Universidade de Tuebingen, da Alemanha, entre outras.
Com o lançamento do Mirax, o Brasil obterá dados sobre importantes classes de objetos astrofísicos e poderá dar significativa contribuição ao conhecimento humano acerca do universo.

Intercâmbio científico

Segundo João Braga, a parceria ítalo-brasileira pode envolver ainda a formação de recursos humanos, com o intercâmbio científico entre o Instituto e as instituições italianas.
"O projeto já conta com o apoio da ICRANet, uma rede internacional de grupos de pesquisa nas áreas de Relatividade, Cosmologia e Astrofísica. Os dados gerados pela missão MIRAX serão utilizados pelos pesquisadores brasileiros e também serão importantes em termos de cooperação científica internacional".
Participam das reuniões com os astrofísicos e engenheiros espaciais do Inpe especialistas do INAF (Istituto Nazionale di Astrofisica), do IASF (Istituto di Astrofisica Spaziale e Fisica Cosmica) e da Universidade de Ferrara.

Marte já foi coberto por oceanos

Agência Fapesp - 14/06/2010

Estudo indica que Marte teve ciclo hidrológico semelhante ao terrestre, com formação de nuvens, chuva e oceano que cobria mais de um terço da superfície do planeta. [Imagem: Gaetano et al./Nature]



A recente descoberta de gelo em Marte reforça a teoria de que o planeta teve um passado muito menos árido do que o atual.
Há cerca de um ano, um grupo de cientistas propôs que uma série de valas no relevo era um indicativo de Marte teve água em sua superfície.
Agora, segundo uma nova pesquisa, o planeta vermelho de fato teve água - muita água - em sua superfície.

Oceanos em Marte

O estudo, feito por dois pesquisadores da Universidade do Colorado, nos Estados Unidos, indica que Marte teve, há cerca de 3,5 bilhões de anos, um ciclo hidrológico semelhante ao existente atualmente na Terra.
O ciclo, de acordo com estudo publicado na revista Nature Geoscience, incluía o acúmulo de água no subterrâneo e a formação de nuvens, chuvas, rios e um oceano que cobria mais de um terço da superfície marciana.
O oceano teria tido um volume de 124 milhões de quilômetros cúbicos de água. O volume é menos de dez vezes o existente atualmente na Terra - veja Cientistas calculam volume de água existente nos oceanos da Terra.
Ainda assim, seria um volume suficiente para formar uma camada de água com 500 metros de profundidade por todo o planeta vermelho.

Hidrosfera marciana

O estudo, feito por Gaetano Di Achille e Brian Hynek, é o primeiro a combinar a análise de características relacionadas à água, incluindo depósitos de deltas e milhares de vales de rios, de modo a investigar a ocorrência de um oceano sustentado por uma hidrosfera global no passado marciano.
Mais da metade dos 52 deltas de depósitos de rios identificados no novo estudo - cada um dos quais com numerosos vales - marcavam os limites do eventual oceano, uma vez que tinham aproximadamente a mesma elevação.
Dos deltas, 29 estavam ligados ao oceano ou a diversos lagos adjacentes de grande volume. Os pesquisadores combinaram dados obtidos por diversas missões das agências espaciais norte-americana (Nasa) e europeia (ESA).

Vales de rios marcianos

Outro artigo, publicado simultaneamente no Journal of Geophysical Research, feito por Hynek e Monica Hoke, também da Universidade do Colorado, descreve a identificação de 40 mil vales formados por rios em Marte.
O número é cerca de quatro vezes maior do que havia sido identificado previamente.
Os vales eram fontes de sedimentos carregados pelas correntes e levados aos deltas adjacentes ao suposto oceano.
"A abundância de vales implica uma quantidade muito expressiva de precipitação. Isso praticamente acaba com a dúvida de que Marte teve chuva em seu passado", disse Hynek. E um oceano era necessário para sustentar essa precipitação.
"Uma das principais questões que gostaríamos de ver resolvida no futuro é para onde foi toda essa água", disse Di Achille. Segundo ele, futuras missões ao planeta - como a Maven, da Nasa, com lançamento previsto para 2013 - devem ajudar a responder tais dúvidas e aumentar o conhecimento a respeito da história da água marciana e da possível existência de algum tipo de vida no passado do planeta.

Bibliografia:
Ancient ocean on Mars supported by global distribution of deltas and valleys
Gaetano Di Achille, Brian M. Hynek
Nature Geoscience
13 June 2010
Vol.: Published online
DOI: 10.1038/ngeo891

Cientistas encontram mais seis planetas fora do Sistema Solar

RICARDO MIOTO
Folha de São Paulo - 15 de junho de 2010

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Astros são todos gigantes; equipe tem participação brasileira.
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A equipe do sonda Corot, que tem participação do Brasil, anunciou ontem a descoberta de mais seis planetas fora do Sistema Solar. Todos bem maiores do que a Terra e, portanto, maus candidatos a abrigarem vida.

A procura por planetas distantes começou em 1995. Já foram encontrados 461 (15 pela Corot). Outras missões, como a Kepler, da Nasa, também fazem buscas.

Para Sylvio Ferraz Mello, astrônomo da USP, isso não significa que os novos resultados estejam só acrescentando mais nomes à lista.

"É incrível, mas não há dois iguais. Encontramos densidades e tamanhos completamente estranhos."

Em um dos descobertos agora, por exemplo, a temperatura sobe de 250C para 600C em apenas 13 dias. Isso é quanto dura um ano no lugar: o planeta está muito perto da estrela que orbita.

O grande objetivo, porém, é achar mais planetas parecidos com a Terra. Eles precisam ser menores e ter crosta rochosa. Em 2009, a Corot achou um, o Corot 7b.

Mas é difícil encontrá-los. A Corot consegue fazer isso observando a diminuição da luminosidade que eles causam nas estrelas que orbitam ao passar na frente delas.

Quando menor e mais leve, então, mais difícil a detecção. O Corot 7b levou 70 noites de observação no Chile para que os cientistas soubessem sua massa, diz Eduardo Janot, da USP.

É difícil também ver planetas que não estão muito próximos da estrela. O Corot 7 tinha um ano de 20 horas -estava "grudado" na estrela.

Newton, Einstein e Deus


MARCELO GLEISER
Folha de São Paulo - 13 de junho de 2010
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Os dois gigantes da física tinham uma relação íntima com certa versão do que se costuma chamar de Deus.

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TALVEZ ISSO SURPREENDA muita gente, mas tanto Newton quanto Einstein, sem dúvida dois dos grandes gigantes da física, tinham uma relação bastante íntima com Deus.
É bem verdade que o que ambos chamavam de "Deus" não era compatível com a versão mais popular do Deus judaico-cristão.
Numa época em que existe tanta disputa sobre a compatibilidade da ciência com a religião, talvez seja uma boa ideia revisitar o pensamento desses dois grandes sábios.
No epílogo da edição de 1713 de sua obra prima "Princípios Matemáticos da Filosofia Natural" (1686), Newton escreve que o seu Deus (cristão, claro) era o senhor do Cosmo e que deveria ser adorado por estar em toda a parte, por ser o "Governante Universal". Essa visão de Deus pode ser considerada panteísta, se entendermos por panteísmo a doutrina que identifica Deus com o Universo ou que identifica o Universo como sendo uma manifestação de Deus.
A visão que Einstein tinha de Deus, devidamente destituída da conotação cristã, ecoava de certa forma a de Newton. Einstein desprezava tudo o que dizia respeito à religião organizada, em particular a sua rígida hierarquia e ortodoxia.
Para ele, um Deus que se preocupava com o destino individual dos homens não fazia sentido. Sua visão era bem mais abstrata, baseada nos ensinamentos do filósofo Baruch Spinoza, que viveu no século 17.
Numa carta dirigida a Eduard Büsching, de 25 de outubro de 1929, Einstein diz: "Nós, que seguimos Spinoza, vemos a manifestação de Deus na maravilhosa ordem de tudo o que existe e na sua alma, que se revela nos homens e animais".
Em 1947, numa outra carta, Einstein escreveu: "Minha visão se aproxima da de Spinoza: admiração pela beleza do mundo e pela simplicidade lógica de sua ordem e harmonia, que podemos compreender".

Como essas posições podem ser usadas no debate sobre a compatibilidade da ciência com a religião?

De um lado, ateus radicais como Richard Dawkins, Christopher Hitchens e Sam Harris argumentam que não pode haver uma compatibilidade, que a religião é uma ilusão que precisa ser erradicada, que o sobrenatural é uma falácia.
De outro, existem vários cientistas que são pessoas religiosas e até mesmo ortodoxas, e que não veem qualquer problema em compatibilizar seu trabalho com a sua fé. O fato de existirem posições tão antagônicas reflete, antes de mais nada, a riqueza do pensamento humano. Nisso, vejo um ponto de partida para uma possível conciliação.
É verdade que o ateísmo radical está respondendo a grupos fundamentalistas que tentam evangelizar instituições públicas. "Guerra é guerra e devemos usar as mesmas armas", ouvi de amigos. Mas o pior que um fundamentalista pode fazer é transformar você nele.
Einstein e Newton encontraram Deus na Natureza e viam a ciência como uma ponte entre a mente humana e a mente divina.
Para eles, adorar a Natureza, estudá-la cientificamente, era uma atitude religiosa. Acho difícil ir contra essa posição, seja você ateu ou religioso. Religiões nascem, morrem e se transformam com o passar do tempo. Mas, enquanto existirmos como espécie, nossa íntima relação com o Cosmo permanecerá.

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MARCELO GLEISER é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor do livro "Criação Imperfeita"

Tempos emocionantes para a ciência brasileira

Ministério da Ciência e Tecnologia
NATURE MATERIALS/ VOL 69/ JUL 2010

Sergio Machado Rezende atuou por 5 anos como ministro da Ciência e Tecnologia do Brasil. Nature Materials perguntou-lhe sobre o passado e o futuro da ciência em seu país.
Por Fabio Pulizzi
 

Como você ficou interessado em física?

Quando eu fiz meu primeiro curso de física na escola, fiquei imediatamente fascinado pela formulação rigorosa da mecânica clássica e a sua capacidade de descrever os fenômenos comuns através de equações simples. Solucionar problemas de física foi muito agradável para mim. No entanto, em 1950, a ciência fundamental realmente não oferecia oportunidades de carreira no Brasil, então eu decidi estudar engenharia, em vez disso. Depois de me formar em engenharia eletrônica no Rio de Janeiro, fui para o MIT, nos EUA, para fazer doutorado. Foi durante este período que os meus interesses se deslocaram de volta para o mais fundamental, ao invés dos aspectos baseados na aplicação dos materiais utilizados na eletrônica, e gradualmente me tornei um físico de materiais.


O que fez você decidir se tornar ativo na política, assim como na ciência?

Não foi realmente uma decisão deliberada, mas consequência do meu envolvimento com a administração e tomada de decisões durante a minha carreira científica. Após meu doutorado, voltei para o Rio, onde fui nomeado professor associado de física na Universidade Católica. No início dos anos 1970, mudei-me para Recife, capital do estado de Pernambuco, no nordeste do Brasil. Na verdade, eu fui enviado para lá em uma missão do Conselho Nacional de Pesquisa para estabelecer um departamento de física na Universidade Federal de Pernambuco. Como eu era o primeiro membro da faculdade de física com um grau de doutorado, era natural que eu me tornasse chefe do departamento. Eu era jovem e aprendi a realizar atividades administrativas paralelas à pesquisa. Na década de 1980, tornei-me reitor do Centro de Ciências Exatas e, no início de 1990, fui convidado a tornar-se diretor científico da recém-criada Fundação de Ciência de Pernambuco, a primeira agência estatal a apoiar a ciência e a tecnologia na região Nordeste. Eu consegui trabalhar nessas posições, enquanto permanecia ativo no ensino e na pesquisa. Em 1995, fui convidado para ser secretário de Estado de Ciência e Tecnologia por Miguel Arraes, o governador eleito, mesmo que eu não tinha envolvimento anterior com política, e em quatro anos ganhei uma experiência considerável na formulação de políticas e em executar programas de ciência e tecnologia.


Na sua opinião, como a ciência no Brasil tem evoluído nas últimas décadas?

Durante a segunda metade do século passado, o Brasil construiu um complexo sistema de ciência e tecnologia que hoje ocupa a décima-terceira no mundo em termos de publicações científicas, de acordo com o banco de dados da Thomson Reuters, à frente de países como a Holanda e a Rússia. Há mais de 100 mil pesquisadores ativos no Brasil de hoje, e nós temos um número considerável de cientistas e engenheiros fazendo pesquisa científica e tecnológica de nível internacional. Entre os exemplos mais conhecidos de sucesso da pesquisa brasileira estão os programas de biocombustíveis, perfuração e produção de petróleo em águas profundas pela Petrobras e o do agronegócio, em que altos níveis de produtividade foram possíveis pelo trabalho realizado pela Embrapa, a organização federal para a pesquisa em pecuária e agricultura.


E sobre o tempo em que tem sido Ministro da Ciência?

Precisamos ter em mente que construir um sistema tão complexo e mantê-lo funcionando exigiu um esforço enorme. A comunidade científica não tinha experiência e não havia cultura de inovação, não havia políticas de ciência e tecnologia constantes, ou investimentos substanciais e, por último mas não menos importante, não havia quase nenhuma conexão entre a pesquisa e a indústria. Houve momentos muito difíceis em que a falta de recursos era tanta, que levava à retenção dos pagamentos de bolsas para estudantes brasileiros no exterior. Felizmente, devido à firme prioridade dada pelo governo do presidente Lula à ciência, tecnologia e inovação na última década, a situação melhorou dramaticamente.


De que maneira? Os investimentos têm aumentado?

Sim. Em 2000, as despesas para a ciência e tecnologia foram da ordem de R$ 15,2 bilhões, o que equivale a 1,3% do produto interno bruto do Brasil (PIB). Em 2008, o investimento ultrapassou R $ 43 bilhões, atingindo 1,43% do PIB. Estes valores incluem o setor público federal, o financiamento dos estados individuais e de empresas públicas e privadas. A participação total do setor público é de 55% versus 45% das empresas. Uma parte importante deste financiamento é do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), que hoje é uma parte importante do orçamento do Ministério da Ciência e Tecnologia. Ele foi criado em 1970, mas durante muito tempo sofreu com a escassez crônica de verbas. No entanto, em 1999, o governo anterior criou os chamados fundos setoriais, que são baseados na tributação de setores específicos da atividade econômica. Estes setores incluem a exploração dos recursos naturais, petróleo e produtos industriais específicos, e incluem taxas sobre as licenças para a aquisição de tecnologia estrangeira. Tais fundos setoriais agora são uma parte integrante do FNDCT, e tornaram possível o seu crescimento consistente. Para se ter uma idéia, o FNDCT desembolsou R$ 350 milhões, em 2002, e em 2010 o montante chegará a R$ 3,1 bilhões.


Que áreas de pesquisa vão se desenvolver mais como resultado desses investimentos?

Até agora, cientistas brasileiros contribuíram principalmente para alargar as fronteiras do conhecimento fundamental, e acredito que este processo vai se intensificar ainda mais. Os pesquisadores estão se tornando mais experientes, os jovens estão expostos a ciência de alta qualidade e as infra-estruturas para pesquisa está melhorarndo. E, em ciência aplicada e engenharia, haverá um esforço em todas as áreas que representam uma prioridade no plano internacional. Para listar alguns: a biotecnologia e a nanotecnologia; tecnologias da informação e de comunicações; saúde; energia; agronegócio; biodiversidade e recursos naturais; regiões da Amazônia e do semi-árido; meteorologia e mudanças climáticas; espaço e pesquisa nuclear.


Foram criados institutos de pesquisa de excelência nessas áreas?

Em parte. Três anos atrás, o governo lançou um programa para os Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia com US$ 330 milhões, para dotar os centros de excelência estabelecidos com os meios de reforçar os seus recursos. Mas temos também criou novas instituições. Um deles é o Centro Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol, em Campinas, São Paulo, com o objetivo de melhorar a tecnologia para produzir etanol a partir da celulose. Também criou um novo centro de microeletrônica, o Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada, em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, e o Centro de Estudos da Terra do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais no Estado de São Paulo, para estudos de mudanças climáticas globais. Nós ampliamos alguns centros que estão sob a responsabilidade direta do Ministério da Ciência e Tecnologia, por exemplo, o Instituto Nacional de Estudos da Amazônia. Mas, além da criação de novos institutos e da expansão dos já existentes, o esforço real foi o de melhorar a infra-estrutura geral para a pesquisa, aumentar o número de investigadores e proporcionar-lhes condições adequadas para produzir bons resultados. Parte disso consistiu em elevar os salários dos cientistas que trabalham nas universidades e nos centros de pesquisa do Ministério da Ciência e Tecnologia.


Pesquisadores brasileiros costumavam ir para o estrangeiro para ganhar experiência. Isso está mudando agora?

Já mudou. É importante esclarecer que somente na década de 1950, com a criação de agências federais de apoio à ciência, o Conselho Nacional de Pesquisa e da Comissão de Aperfeiçoamento de Pessoal de Faculdade, o Brasil começar a lançar os alicerces de uma comunidade científica. Isto foi feito principalmente por concessão de bolsas para pós-graduação no exterior, principalmente nos EUA e na Europa. O primeiro mestrado foi criado no Rio de Janeiro somente em 1963, e demorou vários anos para serem criados mestrados e doutorados em todo o país. É natural, portanto, que as primeiras gerações de cientistas brasileiros tenham estudado no exterior. Atualmente, as universidades e instituições de pesquisa estão bem equipadas, existem programas de pós-graduação excelentes em muitas universidades, e as agências financiadoras oferecem menos bolsas para estudos de pós-graduação no exterior. Por outro lado, a experiência de pesquisa em outros países ainda é considerada muito importante e graduados podem facilmente obter o apoio a programas de pós-doutorado no exterior. O governo também estimula a participação de jovens cientistas em trabalhos de "big science", que exige grandes investimentos e estrutura para participar em colaborações internacionais. Por exemplo, nós apoiamos a participação em programas de investigação dos grandes laboratórios americanos e europeus, tais como Fermilab e Cern para o estudo da física das partículas elementares, e grandes observatórios astronômicos, como o Observatório Austral para a Pesquisa Astronômica e o Gemini, no Chile.


Existe um esforço para aumentar o número de alunos de graduação em ciências?

Totalmente. O governo lançou alguns programas para estimular o interesse da ciência nas escolas. Um exemplo clássico foi a criação, em 2005, dos Jogos Olímpicos de Matemática somente para escolas estaduais. Antes, apenas cerca de 200 mil alunos por ano participariam de tais eventos, e eram majoritariamente de escolas particulares. Alunos de escolas estaduais não se sentiam confiantes o suficiente, então o governo decidiu criar uma competição apenas para escolas estaduais. Dez milhões de alunos participaram, no primeiro ano, número que subiu para 19 milhões, em 2009. Programas desse tipo estimulam o interesse pela matemática, e os melhores alunos podem obter bolsas de estudo e continuar a estudar o assunto em um nível superior. É claro que o interesse crescente na matemática contribui para estimular o interesse em ciência e engenharia também.


Você mencionou a mudança climática: como a ciência brasileira vai contribuir nesta área?

Devemos ter em mente que a mudança climática não é apenas uma teoria científica, mas também uma questão política, com consequências, econômicas, sociais e ambientais globais. O Brasil tem feito a sua posição sobre este assunto conhecida internacionalmente, assim como os seus bem-sucedidos esforços em reduzir emissões e reforçar a sua capacidade de pesquisa científica neste campo. Na recente conferência sobre mudança climática, em Copenhague, o Brasil anunciou o compromisso voluntário de reduzir as emissões de gases com efeito de estufa em 37% em 2020, em relação aos valores normalmente aferidos. Tudo isso tendo em mente que o Brasil é uma sociedade relativamente de baixo nível de carbono. A indústria brasileira teve um recorde de baixas emissões de gases com efeito de estufa, e ainda há espaço para manter ou mesmo reforçar esta tendência, aumentando o uso de fontes renováveis. De acordo com dados do Balanço Energético Nacional de 2008, essa participação é de 45%, o que significa uma matriz energética limpa em comparação com a média mundial, que é de 13%. Um papel importante nesta contribuição é o dos biocombustíveis nos transportes. Com a invenção dos carros flex, feita por laboratórios no Brasil, o uso do etanol da cana de açúcar vem aumentando constantemente e se equiparou ao da gasolina. Uma das maiores contribuições para as emissões de gases com efeito de estufa, no passado, tem sido o desmatamento, mas esforços impressionantes foram feitos também na redução dessas emissões – que caíram cerca de 45%, em 2009, comparado com 2008. Estou convencido de que o Brasil está no caminho certo e contribuirá decisivamente para o esforço global para mitigar a mudança climática. Em relação ao trabalho científico nesta área, temos estabelecido uma ampla rede de laboratórios e grupos de pesquisa envolvidos em todos os aspectos da ciência da mudança climática, como a modelagem climática, as emissões do uso da terra e práticas de agricultura, biodiversidade e recursos naturais, entre outros. Esta rede é liderada por alguns dos cientistas mais experientes do Brasil, que participaram dos painéis internacionais, como o Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima, e tem a colaboração internacional forte.


O senhor é obviamente uma pessoa muito ocupada. Ainda é um pesquisador ativo também?

Estou no sentido de que continuo pensando em física, sigo a literatura, tento dar sugestões a colegas e alunos, e faço alguns cálculos, eventualmente publicando alguns papers. Mas, para ser considerado um pesquisador ativo na minha idade e com minha experiência, eu deveria estar envolvido em muitos outros temas de pesquisa. Eu provavelmente dedico 10% da minha energia e tempo para pesquisar, e isso inclui finais de semana, quando estou mais produtivo. Não é muito, mas permite-me manter em contacto com os desenvolvimentos na área que eu estou mais envolvido, que é a de fenômenos magnéticos em materiais nanoestruturados.


O senhor vai continuar ativo na política, talvez ainda como ministro, no futuro?

Eu definitivamente não vou ficar ministro, independentemente de quem seja eleito presidente para o próximo ano. Até 31 de Dezembro de 2010, eu terei estado envolvido de maneira intensa com política científica por oito anos, 2,5 anos como presidente da Financiadora de Estudos e Projetos e depois como ministro. Acho que isso é suficiente e me sinto recompensado pelos resultados alcançados. Também já comecei a me sentir desconfortável por passar a maior parte do meu tempo longe de casa e da família. Por fim, acredito que uma renovação de conceitos, idéias e práticas será sobretudo benéfica para nosso sistema científico e tecnológico, para mantê-lo saudável e fazer mais progressos.

11 de jun. de 2010

Mais perto das estrelas

Adesão brasileira a projetos de telescópios multinacionais divide opiniões - mas é fundamental para a ciência nacional.
André Julião
05/06/2010

Os brasileiros poderão olhar para o céu com uma visão mais acurada em poucos anos. O País se prepara para ingressar em dois audaciosos projetos em parceria com a Europa. Ambos estão inclusos no Plano Nacional de Astronomia (PNA), cuja versão preliminar foi discutida na 4ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, entre os dias 26 e 28 de maio, em Brasília. O projeto que está em fase mais avançada é o PAU (sigla em inglês para Física do Universo Acelerado), um empreendimento científico em associação com a Espanha.
O consórcio vai construir um telescópio de 2,5 metros de diâmetro no país europeu com custo estimado entre 14 e 18 milhões de euros. A parte que cabe ao Brasil, no entanto, deve sair por três milhões de euros. É o suficiente para construir a câmera de altíssima resolução que fará parte do observatório. O objetivo principal do projeto é observar a energia escura, que comporia 75% do universo atual. A natureza dessa parte do cosmos ainda é um mistério para os astrônomos.
Além da energia escura, conseguiremos observar asteroides e acompanhar a evolução da galáxia e das estrelas, afirma Renato Dupke, astrofísico do Observatório Nacional e coordenador da parte brasileira do projeto. As observações devem começar em 2012 e vão durar quatro anos, com resultados preliminares previstos para 2014. Os países participantes terão direito à exclusividade dos dados coletados durante um ano. Depois, ambos poderão usar o telescópio em estudos de interesse mútuo. Já existem planos de se criar um projeto semelhante, mas com tecnologias mais avançadas, diz Dupke.
Outra iniciativa visa à adesão do Brasil ao ESO (sigla em inglês para Observatório Europeu do Sul), organização de 14 países que opera vários telescópios na Cordilheira dos Andes, no Chile. O ministro de Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende, já enviou uma carta ao diretor-geral do observatório, Tim Dzeeuw, expressando a disposição do País. Dessa forma, teríamos acesso ao E-ELT (em português Telescópio Europeu Extremamente Grande), cuja operação deve ter início em 2018. As vantagens da adesão, no entanto, não são unanimidade. Seria uma irresponsabilidade, diz João Steiner, professor do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP e coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Astrofísica. Segundo ele, os astrônomos brasileiros vão competir em desigualdade com os europeus. Eles determinarão o tempo que cada pesquisador terá para seus estudos, diz.
Segundo Steiner, a participação de cada país varia de acordo com seu PIB (Produto Interno Bruto) e o investimento seria de R$ 1,24 bilhão em 20 anos. O Brasil só adere ao ESO se as condições forem aceitáveis uma exceção terá de ser aberta, afirma Albert Bruch, diretor do Laboratório Nacional de Astrofísica. Outros astrônomos defendem a entrada no programa europeu. Se quisermos que a astronomia brasileira cresça, tornando o Brasil ator global na área, é preciso que haja acesso dos astrônomos brasileiros a essa infraestrutura, disse Beatriz Barbuy, professora do IAG, em artigo na Revista da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo).
O Brasil já participa de pesquisas multinacionais com dois outros telescópios, Soar e Gemini, ambos no Chile. Eles dão conta da nossa demanda. Ainda estamos nos qualificando para aumentá-la, defende Steiner. Segundo ele, a comunidade de astrônomos brasileiros é relativamente pequena. São 235 profissionais que recebem salário de instituições, mais 60 alunos de pós-doutorado e 220 de mestrado e doutorado. Fica a questão: as próximas gerações encontrarão uma infraestrutura melhor para explorar o cosmos?

Para onde vai a astronomia brasileira

Revista Pesquisa Fapesp
NOTÍCIAS
Edição Online - 27/05/2010

Artigos de astrofísicos discutem pontos favoráveis e contrários à entrada do Brasil como sócio pleno do ESO, o consórcio europeu de telescópios situados no Chile.
© ESO
ESO: consórcio europeu administra
telescópios de ponta no Chile.

Um debate sobre os rumos que a astronomia brasileira deve seguir está em curso. De um lado, há pesquisadores a favor da ideia de que, para estimular ainda mais o crescimento desse ramo da ciência nacional nos próximos anos, o Brasil deve se tornar sócio pleno do ESO (European Southern Observatory), o consórcio europeu de telescópios situados no Chile. A entrada no ESO é cara, mas, dizem os defensores dessa visão, seria a forma de garantir aos astrofíscios brasileiros acesso a instrumentos de observação de última geração, como o gigantesco E-ELT (European Extremely Large Telescope), que em 2018, quando deverá estar pronto, será o maior telescópio terrestre. Do outro lado, há cientistas que avaliam não ser essa a melhor opção para assegurar o futuro da astronomia brasileira. Dizem que o custo de virar membro do ESO é excessivamente elevado e pode levar à descontinuação de projetos hoje em curso. Também argumentam que os ganhos científicos e tecnológicos de entrar no ESO são incertos e que essa a questão está sendo discutida sem uma análise técnica.
Para estimular a troca de ideias, o site de Pesquisa FAPESP publica dois artigos assinados por astrofísicos da Universidade de São Paulo (USP) com pontos de vista distintos sobre a questão. Beatriz Barbuy defende a entrada do Brasil no ESO e Augusto Damineli diz que essa não é forçosamente a melhor alternativa. Nenhum dos artigos reflete necessariamente a opinião da FAPESP, mas sim a de seus autores.

Por que o Brasil deve se tornar sócio do ESO?

Revista Pesquisa Fapesp
NOTÍCIAS
Edição Online - 27/05/2010

Para a astronomia brasileira crescer e se tornar um ator global, é preciso que haja acesso dos astrônomos nacionais a essa infraestrutura.
Beatriz Barbuy*

© ESO
Desenho do E-ELT: maior telescópio do ESO ( e do mundo)
está previsto para estar pronto em 2018

A astronomia se distingue atualmente por atingir grandes avanços tecnológicos que permitem aos astrônomos uma obtenção de dados em um nível que antes era impossível atingir, tanto em comprimentos de onda antes inexplorados quanto em profundidade, chegando a objetos muito fracos na fronteira do Universo. O ingresso do Brasil no European Southern Observatory (ESO) nos inseriria em dois grandes projetos: o telescópio gigante E-ELT (European Extremely Large Telescope), com espelho de 42 metros, e o radiotelescópio Alma (Atacama Large Millimeter Array), assim como no mais completo e maior observatório da atualidade, que é o ESO, todos instalados ou em via de instalação, no Chile.

LEIA TAMBÉM

Outra opinião

■ Para conhecer um ponto de vista diferente sobre a entrada do Brasil no ESO, acesso artigo de Augusto Damineli:

O ESO é uma organização intergovernamental, incluindo 14 países, e sua infraestrutura atual tem três observatórios no Chile: La Silla, com telescópios de 2,2 metros, 3,5 metros, 3,6 metros, além de uma dezena de outros pequenos; Paranal, com 4 telescópios de 8,2 metros (Very Large Telescope – VLT), com capacidade de operar interferometria óptica, o Vista (Visible and Infrared Survey Telescope for Astronomy) de 4,1 metros e outros com 1,8 metros a 2,5 metros; eChajnantor, com os radiotelescópios Apex (Atacama Pathfinder Experiment), e o grande projeto Alma, que estará completado em 2014. O telescópio gigante E-ELT será instalado a 20 quilômetros do VLT.
O ESO tem grande diversidade de telescópios e principalmente de instrumentos de alto desempenho e cobriria as necessidades da grande maioria dos astrônomos observadores brasileiros. A instrumentação disponível é a mais avançada da atualidade. De fato, o modo de desenvolvimento da instrumentação do ESO, que se faz em consórcios de diferentes laboratórios/universidades, e sob coordenação do ESO, vem produzindo instrumentos únicos. Note-se que um telescópio não é tudo, precisa-se de instrumentos; que tempo de telescópio não é tudo, pois se o instrumento é eficiente, pode atingir objetos mais fracos e em menos tempo, e/ou grande número de objetos simultaneamente, e/ou grande faixa espectral, o que pode ampliar o campo de observação e reduzir o tempo de observação necessário. Isso representa uma otimização muito significativa de tecnologia e pesquisa. Como exemplo, o ESO é o único observatório que está produzindo instrumentos de segunda geração dos telescópios de 8 metros, que se distinguem claramente daqueles de primeira geração. O primeiro deles, denominado X-shooter, tem cobertura espectral de 300 nanômetros até 2,5 mícrons (ou seja, do ultravioleta próximo ao infravermelho) e com grande eficiência.
Outro aspecto importante dessa organização é sua grande agilidade para resolver problemas técnicos, de maneira que não se perca tempo de observação. Ainda mais um fator importante, é dispor de pacotes de software de redução automática dos dados que saem dos telescópios, o que permite que o astrônomo possa fazer ciência com uso dos dados rapidamente.
Por essas razões, uma maioria significativa dos astrônomos brasileiros (3/4) apoia a ideia de entrada do Brasil como sócio do ESO.
A principal razão para entrarmos como sócios do ESO é que, atualmente, a infraestrutura disponível para a astronomia brasileira é insuficiente para a diversidade de campos de pesquisa que estão se desenvolvendo entre nós, o que faz com que uma grande parcela da comunidade venha tendo dificuldades em obter observações adequadas para seus trabalhos. Os telescópios Soar (Southern Observatory for Astrophysical Research, também no Chile) e Gemini (com dois telescópios, um no Chile e outro no Havaí) têm utilidade para uma fração da comunidade, mas não são suficientes para uma grande parte dela. Além do mais, a ideia é de que sejam mantidos o Soar e a participação no Gemini. O telescópio Soar já foi pago, e as operações estão garantidas por 20 anos desde sua inauguração em 2004. Conterá três instrumentos brasileiros, portanto servirá a uma comunidade particularmente interessada no seu uso. E quanto ao consórcio Gemini, o telescópio do Havaí, por exemplo, dá acesso ao hemisfério Norte.

Nossa entrada no ESO traria consigo intensa formação de recursos humanos e envolvimento da indústria brasileira. O ESO tem programas de inclusão e estímulo, para que os países associados garantam sua fração de tempo de observação e obtenham sua cota financeira para construção de instrumentos, pois de outra forma seria inaceitável pelos países que integram o consórcio. Como estratégia de adaptação para poder competir com projetos de alta qualidade, entraríamos, inicialmente, com uma fração baixa de tempo, e assim ficaríamos por 10 anos, durante os quais a comunidade passaria por um fundamental processo de adaptação, para um crescimento da qualidade da nossa ciência, antes de passarmos a membro pleno.
O custo, de fato, é alto, com a caução de entrada no valor de € 132 milhões. A anuidade, ao passar a membro pleno, seria de € 13,6 milhões. Embora pareça muito, essas verbas voltam ao país através de contratos para construção de instrumentos, bolsas para jovens e todas as viagens ao Chile/Europa dentro das atividades do ESO, isto, é claro, sem falar da coleta de dados pelos astrônomos, do valor científico, que é o principal. Se ingressarmos, deveremos estabelecer formação de pessoal para uso do radiotelescópio Alma, com doutoramentos sanduíche no ESO, conseguindo assim recuperar atividades de impacto nessa área. A verba da caução seria usada para a construção civil do sítio do telescópio gigante E-ELT por construtora brasileira e confecção de partes deste telescópio pela indústria aeroespacial brasileira (já há itens identificados).

Gostaria aqui de comentar que há um custo não palpável na opção de não entrarmos nesse observatório, que é o solapamento de uma competência nacional criada com a formação de pessoal competente capacitado, ao longo dos últimos 40 anos (os primeiros doutores se formaram no exterior no final dos anos 60). É uma comunidade sólida, com um bom número de astrônomos de destaque internacional, e que vem crescendo. Levantamento feito mostra que há 600 astrônomos no Brasil, incluindo pós-graduandos. As especialidades cobrem um bom número de áreas, desde sistema solar, planetas extrassolares até cosmologia observacional. Em 2009, foram produzidos 286 artigos na área de ciências espaciais, segundo lista do Institute for Scientific Information (ISI), em que há autoria/coautoria de astrônomos brasileiros.
Há uma grande demanda reprimida, e grupos em um grande número de áreas estão sendo frustrados e impossibilitados de formar novas gerações por falta de condições técnicas compatíveis com o nível científico já atingido. Portanto, se quisermos que a astronomia brasileira cresça, tornando o Brasil ator global na área, é preciso que haja acesso dos astrônomos brasileiros a essa infraestrutura.

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*Beatriz Barbuy é professora titular do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP).

Pode o Brasil empenhar R$ 1 bilhão da pesquisa científica sem análise técnica?

Revista Pesquisa Fapesp
NOTÍCIAS
Edição Online - 27/05/2010


É isso que está em jogo com as tratativas políticas para o Brasil entrar como membro pleno do ESO, o consórcio europeu de telescópios situados no Chile.
Augusto Damineli*
© ESO
Desenho do E-ELT: maior telescópio do ESO ( e do mundo)
está previsto para estar pronto em 2018.

A imprensa tem noticiado que o ministro da Ciência e Tecnologia, Sergio Rezende, assessorado por dois astrônomos e um diplomata, está em negociações com o ESO (European Southern Observatory) visando a entrada do Brasil nesse consórcio. O pressuposto é de que a astronomia brasileira merece ter acesso à próxima geração de telescópios extremamente grandes (ELTs). Entretanto, isso não pode ser a um custo tão elevado e sem demonstrar os benefícios. Existem opções melhores para atingir esse objetivo e que custariam menos. Vejamos nossa situação atual e as alternativas futuras.

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Outra opinião

■ Para conhecer um ponto de vista diferente sobre a entrada do Brasil no ESO, acesso artigo de Beatriz Barbuy

Situação atual do Brasil: O país tem cotas de 5% nos dois telescópios Gemini de 8 metros de diâmetro (um no Chile e outro no Havaí) e de 31% do tempo de observação no telescópio Soar (Southern Observatory for Astrophysical Research, também no Chile), de 4 metros. Através de troca de tempo, tem também acesso aos telescópios Keck de 10 metros (Havaí), Subaru de 8 metros (operado pelo Japão, mas situado no Havaí) e Blanco de 4 metros (Chile). O Brasil também compra 10 noites de observação por ano no telescópio de 3,6 metros do CFHT (Canada France Hawaii Telescope). Nota importante: a cota de pagamento, nesses casos, corresponde à fração de noites de observação por ano disponíveis para o Brasil. Uma cota de 5% dá, portanto, direito a 18 noites. Nenhum outro país emergente, como Rússia, China ou Índia, tem acesso a uma gama tão rica de telescópios cobrindo os dois hemisférios como o Brasil. Esses consórcios permitiram ao país contribuir com instrumentos de alta tecnologia. Em 2010-11, estaremos implantando três espectrógrafos no telescópio Soar. Isso é extremamente importante para inserir a indústria nacional em itens de tecnologia de vanguarda e é a galinha dos ovos de ouro da astronomia moderna, pois cada avanço da eletrônica, óptica ou computação oferece uma oportunidade de saltos na aquisição de dados.
Perspectivas para o futuro: Os projetos de telescópios ELTs, da classe de 30-40 metros, estão se iniciando, para entrada em operação em 2017-18. A excelente performance brasileira, comparada com a dos sócios nos consórcios atuais, indica que temos chance de bons resultados na próxima geração de telescópios. Arriscamos perder o bonde da história se não participarmos de um dos projetos ELTs. É claro que esse projeto deve prever acesso ao tempo do telescópio ELT de forma proporcional ao seu custo e permitir participação brasileira na construção de instrumentos. Vejamos as nossas alternativas futuras.

Opções (com os custos calculados ao longo de 20 anos, com inflação de 2% ao ano)

1- GMT (Giant Magellan Telescope). Diâmetro de aproximadamente 25 metros, situado nos Andes chilenos. Comprar cota de 5% a um custo total de R$ 140 milhões.

2 - TMT (Thirty Meter Telescope). Diâmetro de 30 metros, situado no Havaí. Comprar cota de 10% a um custo de R$ 380 milhões.

3 - E-ELT (ESO-Extremely Large Telescope). Diâmetro de 42 metros, situado nos Andes chilenos. Comprar cota de 5% a um custo de R$ 380 milhões.

4 - ESO. Tornar-se membro pleno do consórcio e ter acesso ao E-ELT e aos outros do ESO: 4 telescópios de 8 metros, dois de 3,6 metros e um de 2,2 metros. Adquirir cota de 10% (proporcional ao PIB) tem custo total de R$ 1,24 bilhão.

O GMT e o E-ELT têm a vantagem de estarem no hemisfério Sul, onde temos mais alvos de estudo. Os dois têm o mesmo custo por unidade de área de espelho coletor, mas o GMT já declarou sua intenção de receber um espectrógrafo brasileiro, enquanto que a entrada de um instrumento brasileiro no E-ELT seria muito difícil.

A entrada no ESO, além de cara (R$ 6 milhões por astrônomo brasileiro), tem outras desvantagens. O pagamento da cota do ESO não compra acesso ao tempo de telescópio, como ocorre nos outros casos. O ESO promete fazer um balanço para equilibrar o acesso num prazo de 10 anos, mas, nesse prazo, os alvos melhores estarão totalmente estudados e os instrumentos envelhecidos. O acesso aos bons telescópios do ESO é regulado pela competitividade, independentemente de quem pagou. Os grupos que obtêm grandes lotes de tempo são sempre os mesmos. Seria esse um bom negócio para a comunidade brasileira, que é muito mais fraca? Para a Europa que enfrenta problemas de caixa, certamente é um excelente negócio.
A lógica do ESO para a construção de instrumentos funciona bem para uns poucos grupos de instrumentação europeus. Os próprios espanhóis, que são sócios plenos, reclamam que não têm encomendas para fabricar instrumentos para o ESO na proporção da cota que pagam (9,5%, muito próxima do que seria a cota brasileira). Eles publicam mil papers de astronomia por ano, dos quais só 100 são com dados do ESO. Além de já ter emperrado os contatos com o GMT e TMT, a opção pelo ESO descontinuará nossa participação no Gemini (como está acontecendo com a Inglaterra) e impedirá novos projetos instrumentais.
Amparar-se numa comissão tão magra como a atual é a receita certa para dar errado. Um dos membros da tal comissão afirmou aos jornais que a opção de entrar já no ESO é apoiada pela “esmagadora maioria” dos astrônomos brasileiros. Essa consulta ampla não foi feita, embora a SAB (Sociedade Astronômica Brasileira) tenha mecanismos para fazê-lo eletronicamente. Diversos professores titulares do IAG-USP que são contrários à iniciativa não foram consultados e sabemos de institutos do Estado de São Paulo e de Santa Catarina que foram sondados e não apoiam a iniciativa. Mas isso não é relevante, pois interesses corporativistas não são parâmetros para orientar uma politica científica.
A própria CEA (Comissão Especial de Astronomia), criada pelo ministro, aconselhou a só tomar uma decisão após análise cuidadosa de todas as opções. É inaceitável que as negociações com o ESO tenham ido adiante sem análise técnica. Projetos muito menores do que esse, submetidos a fundações de amparo à pesquisa, rotineiramente passam por um comitê de avaliação internacional. Fugir a esse paradigma é um retrocesso. Por que tanta pressa num assunto tão importante?
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*Augusto Damineli é professor titular do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP).