Mário Barra
Do G1, em São Paulo
Especialistas ouvidos pelo G1 já esperam prêmio para os norte-americanos.
Cientistas brasileiros tentar dar continuidade às pesquisas do trio.
Cientistas brasileiros tentar dar continuidade às pesquisas do trio.
Os astrônomos não recebiam um Nobel há 5 anos. Quando o comitê da premiação finalmente lembrou das pesquisas no espaço durante o anúncio dos vencedores na categoria de física nesta terça-feira (4), a homenagem foi para três cientistas que inverteram a "velocidade" do movimento do Universo.
Ao invés de se expandir cada vez mais lentamente, o trio norte-americano desvendou que o cosmo, na verdade, aumenta mais e mais rápido.
Para cientistas consultados pelo G1, as pesquisas mudaram a ideia que existia sobre o Universo. O impacto foi tão grande que era apenas questão de tempo até os três norte-americanos serem lembrados pela Fundação Nobel.
"Esse prêmio era bem esperado, levaram aqueles que mostraram as primeiras evidências fortes de que o Universo estava acelerando sua expansão", afirma Eduardo Cypriano, astrônomo da Universidade de São Paulo (USP). "O trabalho é de muitas mãos, mas os três são os líderes desses grupos de pesquisa e já haviam recebido homenagens antes do Nobel."
Saul Perlmutter, Brian Schmidt e Adam Riess usaram o brilho de explosões de estrelas com muita massa (supernovas) para estudar como o Universo se comporta. Como são fenômenos muito intensos e luminosos, as supernovas conseguem ser detectadas mesmo a grandes distâncias - tão compridas que um raio de luz demoraria 6 bilhões de anos para atravessá-las.
"Foi um modelo muito confiável para mostrar que o Universo estava se expandindo de forma acelerada", diz Cypriano. "Hoje a gente vê algumas limitações para os estudos com esses astros, mas essas pesquisas que o Nobel premiou, feitas na década de 1990, foram as pioneiras."
Paradigma
Antes das observações do trio, os astrônomos acreditavam que a expansão do Universo existia, mas estava ficando cada vez mais devagar. Isso porque eles achavam o espaço era feito apenas por matéria comum - aquela feita de átomos e que forma os objetos e seres que vemos todos os dias.
"Sempre se pensou em um cosmo só com a matéria que conhecemos", diz Antônio Guimarães, cosmólogo do Instituto de Astrofísica, também na USP. Mas ao se voltar para as supernovas, o trio premiado pelo Nobel encontrou astros com menos brilho do que seria previsto caso o Universo se expandisse devagar. "As supernovas estavam a uma distância maior do que deveriam e por isso a luz delas era mais fraca", diz o especialista.
Daí os cosmólogos tiraram a ideia que o Universo estava crescendo em ritmo acelerado. O problema é que se somente existisse matéria comum, isso não seria possível, pois a atração da gravidade retardadia a rapidez da expansão. "Essas pesquisas mudaram o paradigma que existia, elas provaram que as supernovas estavam mais longe do que se pensava e que o Universo se expande cada vez mais rápido", explica Guimarães.
A solução foi encontrar algo a mais para explicar um cosmo com pressa para crescer. Foi aí que os astrônomos surgiram com a ideia da energia escura - algo diferente da matéria, que os especialistas acreditam que seja responsável pela expansão e ocupe 73% do Universo. "Nós não sabemos do que ela é feita, essa é a grande questão aberta na física hoje. É a principal linha de pesquisa atualmente, além da caça a planetas fora do Sistema Solar", diz o cosmólogo.
O erro de Einstein
Outro vencedor do prêmio Nobel, em 1921, Albert Einstein é idolatrado no mundo científico pois definiu as bases da física usada atualmente. Mas ele levou certo tempo para admitir um erro nos seus cálculos: o universo não era estático, ele crescia com a passagem do tempo.
As próprias equações da teoria da relatividade geral, publicadas em 1915, concordavam. Para que fossem válidas, o Universo deveria estar se expandindo ou em redução.
Para salvar a ideia de um Cosmo "parado", Einstein tentou melhorar suas equações. Ele usou um recurso matemático para que a sua teoria continuasse válida. O termo ficou conhecido como constante cosmológica.
Na década de 1920, com os trabalhos de cientistas como o norte-americano Edwin Hubble, a expansão do Universo ficou provada e Einstein acabou considerando a constante cosmológica como algo inútil. E assim pensaram os cientistas durante muito tempo, até que as pesquisas sobre o crescimento do Cosmo mostraram uma possível aplicação para o "erro de Einstein".
"A constante se tornou o primeiro candidato à energia escura, justamente aquela que os cientistas acreditam ser a responsável pela aceleração da expansão do Universo", explica Jailson Alcaniz, pesquisador do Observatório Nacional, no Rio de Janeiro.
Outra opção
Ainda mais grave para o legado de Einstein - morto em 1955 - seria se sua teoria sobre a gravidade inteira fosse negada pelos estudos no futuro. Essa opção existe e há pesquisadores que trabalham com modelos para explicar o Universo que não utilizam a ideia de energia escura e julgam as equações do gênio alemão erradas.
"Se isso for verdade, uma outra teoria teria de substituir a relatividade geral de Einstein", diz Alcaniz. "Existem várias candidatas como, por exemplo, a existência de dimensões extras no cosmo, que poderiam causar a expansão do Universo", diz Alcaniz. Mas o especialista não acredita que seja tão fácil descartar a relatividade. "Ela passa em todos os testes de precisão no Sistema Solar."
"Essas pesquisas mudaram o paradigma que existia,
elas provaram que as supernovas
estavam mais longe do que se pensava e que
o Universo se expande cada vez mais rápido"
Antonio Guimarães,
cosmólogo da USP
Alguma luz na energia escura
O Brasil participa ativamente de pesquisas sobre a expansão do Universo e a busca pelo o que poderia motivar esse movimento.
"A nossa esperança é jogar alguma luz na energia escura", diz Laerte Sodré Jr, cientista da USP e ligado a diversos projetos brasileiros com universidades no exterior para investigar a natureza e a própria existência da principal candidata a "culpada" pela expansão acelerada do Universo.
No passado, conceitos como o geocentrismo (a Terra como centro do Sistema Solar) e o éter luminífero (um espaço que precisaria existir para que as ondas de luz pudessem prosseguir) foram derrubados, mesmo com muitos cientistas conduzindo experimentos para salvá-los.
Seria este o mesmo caso da energia escura - algo que ninguém provou que existe e tão diferente da energia e da matéria comuns? Sodré Jr. acredita que não. "O que nós sabemos hoje na cosmologia é que energia e matéria escura dominam o Universo", diz o astrônomo. "No momento, todos os dados que nós temos apontam para a validade da relatividade de Einstein e, a partir dessa teoria, a hipótese da energia escura é a mais aceita atualmente."
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