Folha de São Paulo - 24/01/2011
Basta baixar um programa de computador e observar os gráficos que ele mostrar, dizem os pesquisadores.
Quase 15 mil usuários pelo mundo já estão "brincando" de cientista em seus PCs, analisando os dados brutos da Nasa.
SALVADOR NOGUEIRA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Agora qualquer pessoa com uma conexão à internet e sem formação científica pode se tornar um caçador de planetas. Isso graças a uma ideia de pesquisadores da Universidade Yale, nos Estados Unidos.
Para participar, basta acessar o site www.planethunters.org(ele funciona em praticamente todos os navegadores de última geração, menos o Internet Explorer, da Microsoft) e se cadastrar.
Ao fazer isso, o usuário passa a ter acesso a um gráfico que representa a variação de luminosidade de uma dada estrela.
Analisar corretamente essa curva de luz é a chave para que ele possa encontrar um potencial planeta girando ao seu redor.
Os dados brutos vêm do telescópio espacial Kepler, da Nasa. Lançado em março de 2009, o satélite foi apontado para uma região da Via Láctea com maior densidade de estrelas. Com isso, fez observações da luminosidade de centenas de milhares desses astros ao longo do tempo.
A ideia é identificar novos planetas ao captar a mudança de brilho provocada na estrela quando um desses objetos passa entre ela e o telescópio Kepler.
Dependendo do quanto o brilho se reduz e em que periodicidade, é possível estimar a órbita e o diâmetro aproximados do planeta.
Os pesquisadores ligados ao Kepler têm anunciado algumas descobertas feitas com o telescópio, mas é simplesmente impossível analisar todos os dados pessoalmente. Eles então usavam fórmulas complexas de computador para proceder com uma análise automática.
CÉREBRO
O projeto PlanetHunters nasceu da aposta de que a capacidade de processamento do cérebro humano é maior que a das máquinas para identificar esses chamados trânsitos planetários. O esforço foi iniciado em dezembro do ano passado, e já conta com cerca de 14,4 mil participantes pelo mundo.
"O truque é fazer muitas pessoas olharem para os mesmos dados", explica Kevin Schawinski, astrônomo de Yale e um dos idealizadores do projeto.
"Se uma pessoa sugere que há um trânsito, vai saber? Mas se oito em dez dizem a mesma coisa, provavelmente é bom darmos uma olhada de perto."
"Pessoas e algoritmos de computador são boas em enxergar coisas diferentes. No caso de curvas de luminosidade, um ser humano tem muito mais chance de enxergar um planeta com um baixo número de trânsitos numa estrela de brilho variável. Em situações assim, o reconhecimento de padrões humano ainda é muito mais poderoso que o de computadores."
DADOS
Com o poder do que se convencionou chamar de "ciência-cidadã" para complementar os resultados do Kepler, o grupo de Yale está fazendo descobertas que os cientistas responsáveis pelo satélite deixaram escapar.
"A quantidade de dados do Kepler é enorme", diz Debra Fischer, co-criadora do PlanetHunters.
"Então, na verdade, estamos ajudando a equipe do satélite. Uma grande amiga minha está lá, então ficou bem fácil conversar com ela sobre como podemos ajudar e complementar os esforços deles, em vez de competir."
Para os usuários, fica o gostinho de ajudar a produzir ciência de ponta e -quem sabe- ajudar a encontrar um gêmeo da Terra fora do Sistema Solar. Além é, claro, do reconhecimento público. "Nós os agradecemos em todos os nossos artigos científicos", diz Schawinski.
Os voluntários até agora já fizeram cerca de 1,2 milhão de classificações de gráficos estelares e o grupo deve terminar de analisar todos os dados do primeiro lote do Kepler até fevereiro, quando a Nasa liberará um novo pacote de informações.
Astronomia já usa ajuda do público
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Não é de hoje que a astronomia se tornou o campo mais fértil para o uso de colaboradores não-cientistas recrutados pela internet.
O esforço pioneiro nesse sentido foi o projeto SETI@Home. Criado em 1999, ele usava computadores de voluntários para processar dados de radiotelescópio em busca de sinais enviados por civilizações alienígenas.
Para participar, era muito simples: bastava baixar um descansador de tela que entrava em operação quando a sua máquina estava ociosa.
Conectado à internet, ele baixava um pacote de dados, processava e devolvia os resultados. O usuário não participava do processo, exceto cedendo o poder de sua máquina.
PARTÍCULAS
Projetos subsequentes na mesma linha passaram a exigir maior participação dos internautas do que o SETI@Home.
O pessoal da sonda Stardust, da Nasa, por exemplo, recrutou participantes do mundo inteiro para sondar imagens feitas da câmara de amostras da espaçonave em busca de sinais de partículas de origem interestelar para estudos posteriores. (SN)
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